Numa altura em que tem sido mais falado pela sua vida pessoal do que pelo seu trabalho (mais propriamente o seu muito controverso apoio à candidatura de Donald Trump), Clint Eastwood vê ser praticamente ignorado um dos momentos mais especiais da sua carreira recente : o encontro pela primeira vez com Tom Hanks. É que Eastwood é o último dos clássicos e Hanks é o único actor de Hollywood que ainda consegue ter um pouco dessa gravidade do tempo em que o star system ainda era uma coisa que existia mesmo na cidade dos sonhos.
Milagre no Rio Hudson é a história real do caso do piloto norte-americano, Chesley Sully (Tom Hanks), que amarou de emergência no rio Hudson sem provocar um único ferido, depois do seu boeing chocar com um bando de pássaros. Mais uma história com aviões em Nova Iorque, mas esta com final feliz. Talvez por isso tenha vindo parar ao cinema tão rapidamente – é que os americanos ainda não se refizeram do traumático onze de Setembro.
Sully foi elevado a herói nacional e o seu feito encheu as parangonas de todo o mundo. O que provavelmente a maioria dos não-americanos não chegou a perceber é que as autoridades tentaram desacreditar o piloto, num piloto judicial mediático em que foi acusado de negligência.
Mais do que um filme de tribunal a tentar decidir entre a culpa e a inocência de um homem, Milagre no Rio Hudson é um filme sobre a efemeridade da fama, a importância do heroísmo e, de certa forma, da humanização do herói. E ao contrário de Sniper Americano, que de certa forma abordava a mesma temática, Milagre no Rio Hudson é bem menos panfletário. O que pode fazer sossegar todos aqueles que temiam que Eastwood não soubesse distinguir as suas convicções pessoais dos seus filmes e desatasse a fazer trabalhos fascistas. Esse tempo já passou e esses filmes chamam-se Dirty Harry…
Eastwood tem ainda o condão de filmar uma história que parecia condenada ao tarefismo anónimo de uma forma interessante, começando logo pela desconstrução da linearidade narrativa. Aliás, só vemos o acidente a acontecer já o filme vai a mais de meio. E depois Eastwood mostra-o várias vezes, de diferentes perspectivas e pontos de vista. Só pela forma como consegue contar esta história de forma pouco expectável já merece o McBacon.Título: Sully
Realizador: Clint Eastwood
Ano: 2016