Os malucos são os que fazem as cenas mais doentias, mas ao mesmo tempos são os mais apaixonados. John Waters é assim. Um maluquinho que adora freaks, gore e outras coisas desviantes, mas que ama o cinema e que o demonstra a cada filme que o faz (mesmo que sejam sobre freaks, gore e outras cosias desviantes). É assim com Cecil B. Demente, a sua declaração de amor à sétima arte.
Podemos ver em Cecil B. Demente o equivalente ao Cinema Paraíso de John Waters, o rei do camp. O próprio nome, num trocadilho com o do megalómano Cecil B. DeMille, foi-lhe chamado um dia por um jornalista e Waters gostou tanto que o adoptou agora para o protagonista do filme. Stephen Dorff é então Cecil B. Demente, o realizador e líder de uma gangue de cinéfilos rebeldes, que vão raptar a grande estrela do star system, Honey Whitlock (Melanie Griffith), e fazer um filme-guerrilha que vai dinamitar o sistema por dentro.
Cecil B. Demente é completamente niilista, mas feito com tanto amor, que a honestidade nos conquista. O argumento pode ser anárquico (uma forma simpática de contornar o adjectivo “nulo”), as interpretações podem ser (semi)amadoras e a realização pode ser ao nível de um teatrinho de escola, mas vemos que toda a gente se está a divertir tanto a fazer o filme que é impossível não nos divertirmos também. E é quando John Waters faz inside jokes, colocando bem fundo o dedo na ferida do que é o sistema cinematográfico “comercial” para as massas, que Cecil B. Demente é melhor – uma sequela de Forrest Gump, um director’s cut do Patch Adams ou um multiplex em que as salas só exibem sequelas do Star Wars e do Star Trek.
O que acaba por ser estranho é que John Waters não usa tantos freaks quanto isso aqui. Cecil B. Demente não é nenhum Pink Flamingos nem anda lá perto – apesar de ter Patricia Hearst, claro. A sua marca encontra-se sobretudo na estética camp e no estilo guerrilha. O Double Cheeseburger vale pela intenção, não pelo resultado final.Título: Cecil B. DeMented
Realizador: John Waters
Ano: 2000