Epá… mas alguém me pode explicar o que se passou aqui?
Todos estamos habituados a ver Edgar Pêra, um dos grandes autores do cinema português, a fazer coisas muito diferentes, entre o experimentalismo mais vanguardista até ao mais brega (lembram-se do brilhante Arquitectura de Peso, com o grande Nel Monteiro?), mas… nada me preparou para uma comédia-xunga-televisiva como Virados do Avesso.
Diogo “Hot Jesus” Morgado acorda então uma manhã e não se lembra que é gay, apesar de ter Jorge Corrula a dormir ao lado. Mais tarde, o médico Nicolau Breyner (que saudades de ter o nosso Nico em todos os filmes portugueses que estreavam por ano) vai explicar que foi uma doença passageira. Mas até lá, Diogo Morgado vai comportar-se como um macho viril e marialva, indo ao strip (numa cena assustadoramente longa), embebedar-se ou ambos ao mesmo tempo.
O filme são apenas sucessões de gags como se estivéssemos a ver Os Malucos do Riso ou Os Batanetes (7 Pecados Rurais a fazer escola), devidamente rematados por uma careta ou uma punchline, do tipo daquelas do Camilo (lá fora está-se melhor… tá-se tá-se… tááá-se! – vide ao minuto 7:56) e com demasiadas piadas de gosto duvidoso. Aliás, na parte final deste texto, o Ricardo Vieira Lisboa explica bem como é que Virados do Avesso é ofensivo ao redefinir o conceito de heteronormatividade.
Sem qualquer valor de produção adicional, Edgar Pêra filma tudo com a câmara assente em pedras de gelo, enchendo o filme de efeitos-sonoros enlatados e mais meia-dúzia de efeitos completamente dispensáveis. Pelo meio, ainda arranja uns buracos para encher com meia-dúzia de celebridades televisivas, como Bárbara Guimarães a fazer dela própria ou Rui Unas sempre com um grande plano do bigode. Tudo isto é temperado com a banda-sonora da moda de Anselmo Ralph, que também dá uma perninha como actor.
Diz-se que, actualmente, o cinema se mudou para a televisão e que é no pequeno ecrã que se pode experimentar realmente o que os grandes estúdios não permitem no grande ecrã. Mas isso não é na televisão portuguesa. Virados do Avesso é tudo aquilo que a produção televisiva nacional tem de mau e exportada para o cinema. No meio deste desastre todo, fica-me a dúvida do que será a única coisa que se safa. Será o Nuno Melo de capachinho ou aquele momento em que o filme termina? O Pão com Manteiga responde a esta questão.
Título: Virados do Avesso
Realizador: Edgar Pêra
Ano: 2014