| CRÍTICAS | Dos Homens sem Lei

O Lau é uma terreola no concelho de Palmela que, além de ser provavelmente uma das únicas localidades do país com um nome monossilábico, tem duas ruas (uma que sobe e outra que desce) e meia dúzia de habitantes. Se eu fosse realizador de cinema, o meu primeiro projecto seria um filme de caubóis passado no Lau, que se chamaria Lau sem Lei, em homenagem ao western alentejano do Mataram-me!. E a versão internacional chamar-se-ia Lauless.

Este Lawless, no entanto – que em português se chama Dos Homens sem Lei – não é esse filme. É antes a história baseada em factos verídicos dos manos Bondurant, famosos contrabandistas de álcool no interior dos Estados Unidos durante a Lei Seca. Ou seja, uma espécie de Al Capone em versão saloia.

É natural que John Hillcoat e Nick Cave tenham acabado por serem chamados para adaptar a história ao cinema, uma vez que a obra de ambos é feota à volta dos mesmos elementos, a saber: rednecks, tiroteios, violência, temência a Deus… Basta ver como o filme anterior de ambos, Escolha Mortal, é uma espécie de western australiano. Ou então ler o livro de Cave, E o burro viu o anjo, ou ouvir temas seus, como Stagger Lee, ambientado no mesmo cenário.

Os Bondurant são então três irmãos, em que dois deles, Tom Hardy e Jason Clarke, são conhecidos por serem durões, especialmente o primeiro, que até tem uma lenda que diz que é imortal após escapar da morte certa várias vezes. Lá para o meio do filme hão de lhe cortar a garganta de orelha a orelha, mas ele há de caminhar pela neve durante quilómetros, até ao hospital, dando força ao mito. E, no entanto, Hardy tem um apurado lado maternal escondido. Por sua vez, Shia LeBeouf é um franganote medroso, mas determinado em provar aos irmãos que ele não é o perdedor que eles vaticinam.

Assim, quando os Bondurant expandem o negócio para outro estado, vão acabr por ficar no alvo do agente Rakes (Guy Pearce), que veio de propósito de Chicago para pôr termo ao tráfico de álcool.Eao mesmo tempo que há uma escalada de violência (com aquele estilo muito seco e gráfico, que John Hillcoat foi buscar a Sam Peckinpah), os irmãos desenvolvem uma história de crescimento e de fraternidade, lealdade e de perdição pelo poder e dinheiro. Se bem que através dos filtros pouco morais e éticos dos saloios norte-americanos, claro.

Com um elenco de luxo, um realizador e um argumentista de excepção e todos os elementos certos, Dos Homens sem Lei só poderia dar uma obra-prima, certo? Errado! O problema do filme é que, apesar de tudo isto (e, especialmente, de ter noção de tudo isto), é que tem um argumento extremamente curto, que quando puxa o cobertor para tapar os pés destapa a cabeça. Começa logo pela personagem de Guy Pearce, que monta um vilão perfeito: um sádico metrossexual demasiado perfumado, mas de quem nunca sabemos as motivações. Depois há Gary Oldman, mas só o vemos duas ou três vezes. E ainda há de surgir Jessica Chastain e Mia Wasikowska, apenas porque o filme deveria ter também mulheres e a habitual muleta dramática do romance. O caso de Jessica Chastain é o pior: uma estrangeira que chega à aldeia vinda da grande cidade, onde era dançarina exótica, com vários esqueletos na bagagem, mas que nunca adianta nem desata nada para a história.

Por isso, Dos Homens sem Lei limita-se a juntar um par de clichés, numa história tremendamente banal. Mas fa-lo de forma irrepreensível e com a ajuda da bela banda-sonora de Nick Cave. O McChicken é mais do que suficiente para aconchegar o estômago, mas perante tamanho potencial do material é inevitável que pedíssemos mais. Muito mais.

Título: Lawless
Realizador: John Hillcoat
Ano: 2012

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