Durante os anos da escravatura nos Estados Unidos e, depois, os da segregação, milhares de mulheres negras foram violadas por homens brancos de forma impune, como se isso fizesse parte da sua condição. A sua invisibilidade social tornavam a mulher negra duplamente segregada, rebaixada à condição mais baixa do estatuto humano. Até que uma dessas mulheres atacadas decidiu não ficar calada, falou e contribuiu decisivamente para alterar as coisas. Essa mulher foi Recy Taylor, teve a ajuda fundamental da activista Rosa Parks (a que se recusou a ceder o seu lugar no autocarro a um branco, num episódio fundamental da história dos direitos humanos nos Estados Unidos) e deu origem a este documentário, que ainda conseguiu ver em vida.
Também durante esses anos, o Cinema era uma indústria fechada às comunidades negras. Estes apenas se viam representados em filmes raciais, feitos por negros e com negros, direccionados para essa larga franja do público que ia então aos cinemas. São imagens desses filmes que A Violação de Recy Taylor utiliza para complementar as poucas imagens de arquivo disponíveis, num documentário de formato convencional e académico de cabeças falantes.
A realizadora Nancy Biarski começa também por utilizar a banda-sonora para enfatizar e dramatizar uma situação que não necessita de artificialismo para nos comover e isso é a primeira coisa que irrita no filme. A segunda é que, quando Rosa Parks entra na história, A Violação de Recy Taylor parece mudar de foco, como se Nancy Birski receasse que a história de Recy Taylor não fosse suficiente para o público. Plot twist: era mais do que suficiente.
Isso faz com que pareça que A Violação de Recy Taylor sejam dois filmes num só. É um documentário que interessa sobretudo pelo tema, mas que tem mais como função o debate, a pedagogia e o despertar de consciências, em vez da cinefilia, da sala de cinema e do grande ecrã e dos Cheeseburgers desta vida.
Título: The Rape of Recy Taylor
Realizador: Nancy Buirski
Ano: 2017