| CRÍTICAS | High Life

Todos nós estamos fartos de ver as mais estranhas criaturas no espaço, encurraladas em naves com humanos, desde vários tipos de bicharada a fantasmas, passando por outras tantas formas inclassificáveis. E, no entanto, nunca antes havíamos visto no espaço uma criatura como a que vai com Robert Pattinson na nave de High Life: um… bebé!

É isso mesmo. Robert Pattinson sozinho numa nave no meio do espaço com um bebé. Ao longo do filme iremos perceber como é que surgiu aquela criança, que missão é aquela e como é que se chegou aquele estádio. Mas High Life tem o seu ritmo muito próprio, esculpido a partir dos silêncios (mais pela ausência de vida naquela nave do que por outra coisa) e com uma estrutura narrativa não-linear, que vai atrás bastantes vezes sem aviso para contextualizar o presente, que demoramos um pouco a habituar-nos.

High Life vai-nos dando sinais. Percebemos que estamos num eventual futuro, mas a tecnologia da nave não é propriamente hi-tech. Há muitos botões e alavancas manuais, daqueles que se tem mesmo que pressionar (e com força) e que até fazem ruído, que dão, além de personalidade, alguma textura ao filme. Depois lemos a realizadora Claire Denis a dizer que preferiu influenciar-se na imagética da cosmologia soviética, em vez da da Nasa, como 99 por cento dos filmes de ficção-científica.

Também por isso, é fácil apontarmos as semelhanças com Solaris. Mas que filme no espaço assim mais tétrico não o é? Também é fácil puxar da referência a 2001: Odisseia no Espaço, mas High Life acabará por ser bem claro sobre os seus intuitos ao contrário dos filmes de Tarkovsky ou de Kubrick: esta é uma história sobre sexualidade. Apesar daqueles astronautas irem numa missão suicida, há a bordo uma médica (Juliette Binoche) que tem o objectivo de criar no espaço o primeiro bebé.

Finalmente, também é refrescante ver um filme sci-fi cerebral que não procura a metáfora bíblica da Criação (olá Gravidade, olá I am Mother), pelo menos na forma mais óbvia (e com arquétipos). Aqui, a vida é toda ela procriação, sexo e, especialmente, fluídos. Não há nenhuma nudez ou pessoas a fazer sexo, mas existem fluídos, todos eles – sémen, sangue, leite… – como que a dar ainda mais orgânica ao filme. E tudo isso atinge o ponto-caramelo na cena em que Juliette Binoche se masturba numa… fuck-box(!).

Se aliarmos a tudo isto a banda-sonora incrível dos Tindersticks, então o filme de Claire Denis acerta em cheio no jackpot. É reflectivo sem ser aborrecido, enche o olho sem a masturbação visual de um Terrence Mallick (a referência não é inocente, é que há um par de momentos que trazem à memória A Árvore da Vida) e é tétrico sem ser hermético. É um Le Big Mac bem suculento e um dos melhores do ano.

Título: High Life
Realizador: Claire Denis
Ano: 2018

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