| CRÍTICAS | Um Dia de Chuva em Nova Iorque

É incrível que em 2019, numa altura em que as acusações de abuso sexual de Woody Allen voltaram a ganhar peso (de tal forma que este seu novo filme nem sequer estreou nos Estados Unidos), que ainda haja gente que não saiba do que se trata. Vamos lá arrumar isto de uma vez por todas. Woody Allen casou com a filha adoptiva de Mia Farrow, Soon-Yi Previn. Tudo ok aqui. Quem o acusa de abuso sexual é a filha adoptiva, Ronan Farrow, caso que já foi julgado mais do que uma vez e nunca foi provado nada. Ou seja, Allen nunca casou com a filha nem sequer é isso que está em causa, ok?

Posto isto, saltamos directamente para Um Dia de Chuva em Nova Iorque, o seu trabalho de 2019, depois de um ano de ausência. E isso sim, é esquisito. É que desde 1969 que, em apenas 5 anos, Woody Allen não estreou nenhum filme. E a última vez que isso acontecera fora em 1981. O que, por mais que o repitamos, continua a ser impressionante.

Um Dia de Chuva em Nova Iorque é o típico filme de Allen. Uma pequena história de actores (Timothée Chalamet e Elle Fanning) rodada na sua Nova Iorque natal, sobre a vida e o amor (salvo a redundância), com os habituais diálogos curtos e neuróticos, algum caos felliniano, humor auto-depreciativo, o jazz de Chet Baker na banda-sonora e muito sofrimento existencialista. Parece tudo muito simples, demasiado simples, mas depois por alguma razão obscura não o é. Alguém escreveu certa vez as palavras sábias de que a diferença entre um bom e um mau filme de Woody Allen é nenhuma e são filmes como Um Dia de Chuva em Nova Iorque que dão razão a esta máxima.

Depois de Manhattan, este é talvez a maior carta de amor de Allen à sua Nova Iorque amada. A cidade é ela própria uma personagem, nesta história de 24 horas, em que Timothée Chalamet deambula por Nova Iorque cruzando-se com outras personagens em pequenas vinhetas, ao mesmo tempo que a sua namorada Elle Fanning faz o mesmo, de forma desencontrada. Chalamet é o habitual alter-ego de Allen e é o pior do filme, porque se esforça em demasia em copiar o realizador. Ou seja, em vez de ser uma versão de Woody Allen, é uma imitação de Woody Allen. Quer dizer, só não é o pior do filme, porque esse prémio fica reservado para Elle Fanning, num overacting irritante também.

Curiosamente, a melhor coisa do filme é mesmo Selena Gomez, que surge num par de episódios e que rouba completamente para si as cenas. Também andam lá Jude Law, Diego Luna e Liev Schreiber, que dão algumas pinceladas de cor à história. No final, depois de uma intoxicação de toneladas de name dropping e de referências aos gostos de Allen (de filmes a actores, passando por músicos e canções), o filme resolve-se da mesma forma simples com que conta a sua história, ou seja, com um lugar-comum. Mas Um Dia de Chuva em Nova Iorque não é um cliché, é apenas a simplicidade habitual de Allen a trabalhar os seus próprios códigos e signos, com grande savoir faire e descontração. Ou se gosta ou não se gosta, a diferença entre ambos é nula, assim como o McChicken.

Título: A Rainy Day in New York
Realizador: Woody Allen
Ano: 2019

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