| CRÍTICAS | O Falcão Manteiga de Amendoim

O buddy movie com pessoas com alguma deficiência é um subgénero que, normalmente, encontra grande sucesso junto do grande público. Apesarem de ser quase sempre condescendentes e paternalistas, as pessoas gostam de ver estas mensagens inspiradoras no grande ecrã porque assim se sentem melhor consigo próprias, sem terem que se preocupar mesmo com isso. Obviamente que existem excepções (olá Encontro de Irmãos, como estás?), mas a maioria desses filmes caiem nesse lugar-comum (sim, estou a falar contigo, Amigos Improváveis).

Com O Falcão Manteiga de Amendoim há que admitir que, pelo menos, é um filme sem receios de correr riscos. Afinal de contas, coloca um miúdo com Síndrome de Down (excelente Zack Gottsagen) a fugir apenas de cuecas durante grande parte do filme. Zack está cansado de ser tratado como um coitadinho, a viver num lar de idosos que não tem nada a ver consigo apenas porque o poder local daquela parvalheira no fim do mundo no sul dos Estados Unidos não sabe o que fazer com ele, e vai escapar com a ajuda do sempre genial Bruce Dern (uma curta aparição, mas o suficiente para deixar a sua marca).

Pelo caminho, Zack cruza-se com Shia LaBeouf, um pé-rapado sem ter onde cair morto, que está a fugir duns rufias locais depois de lhe ter pegado fogo ao material de pesca. Apesar de parecerem muito diferentes, os dois são, na verdade, as duas faces da mesma moeda: ambos são marginais da sociedade, colocados de parte pelas suas limitações; ambos são órfãos (e a orfandade de Shia LaBeouf é bem recente, tanto que temos que levar com uns feedbacks de quando em vez, completamente desnecessários, para forçar o melodrama); e ambos procuram encontrar um sentido para a vida. Este último bem pode estar na escola de wrestling do mítico Salt Water Redneck (Thomas Haden Church), que vai ser o destino dos dois amigos.

Até aqui tudo bem, incluindo – e este é o segundo trunfo de O Falcão Manteiga de Amendoim – a forma como aborda a doença de Zack Gottsagen, nada condescendente, que não se limita a ser definido pela sua condição. O pior é o que os realizadores Tyler Nilson e Michael Schwartz decidem fazer com ele. Primeiro embrulham tudo num pacote de filme indie, daqueles que fez escola na última década e meia, com muitos filtros e musiquinha loló (não é por acaso que foi um dos destaques no festival SXSW); e depois porque lhe enfiam a martelo Dakota Johnson, porque valha-me deus se não haveria aqui um relacionamento amoroso.

Dakota Johnson é a assistente social que vai perseguir Zack, porque o seu patrão não quer avisar o Estado, porque corria o risco de não ter filme. Assim, O Falcão Manteiga de Amendoim é bem-intencionado, mas está sempre a tropeçar nos seus próprios pés. Ou seja, num argumento por vezes demasiado curto, resolvido de forma preguiçosa e pateta. Como a cena em que os mauzões que perseguem Shia LaBeouf os encontram finalmente, lhes pegam fogo à balsa e estão quase a mata-lo, quando tudo se resolve com uma conversa profunda.

O Falcão Manteiga de Amendoim é simpático, até porque lhe fica bem o ar de Huckelberry Finn dos tempos modernos naqueles bayous muito fotogénicos, mas não passa disso. E mesmo o final, que tinha tudo para ser uma espécie de variação de Uma Família à Beira de um Ataque de Nervos (num combate de wrestling com o próprio Jake Roberts (mas sem cobra)), acaba por sair furado, porque o saco se esvazia demasiado depressa. Um Cheeseburger pelas boas intenções, daquelas de que o inferno está cheio.

Título: The Peanut Butter Falcon
Realizador: Tyler Nilson & Michael Schwartz
Ano: 2019

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