Depois de duas curtas que lhe deram notoriedade – e um Urso de Ouro em Berlim -, Leonor Teles estreou-se no formato longo, com um filme que não podia ser mais diferente, tanto formal como tematicamente. Em vez da atitude punk de Balada de um Batráquio ou Rhoma Acans, Terra Franca é um documentário quase ficção; e em vez da temática cigana das duas curtas, Terra Franca é um filme sobre uma a família Lobo, de Vila Franca de Xira, com o senhor Albertino, pescador no Tejo, como figura pivot.
O senhor Albertino é então um pescador cuja licença não foi renovada. Seguimo-lo na sua rotina diária solitária, seja no rio Tejo seja nas lides domésticas, a levar a mulher para o café onde trabalha, seja em casa com as filhas, preparando o casamento da mais velha. A câmara de Leonor Teles é sempre observacional e contemplativa, a condizer com os momentos a solo de Albertino no seu barco de pesca, sempre com a ponte Marechal Carmona por trás, mas que depois lhe dá textura ao sobrepor com uma banda-sonora anacrónica: o jazz crooner de Nat King Cole ou a soul de Otis Redding.
Terra Franca não podia ser um filme mais português do que é. Há a ameaça da troika – o filme foi filmado durante a intervenção do FMI -, há as festas populares, há o Quim Barreiros no programa da manhã e há o Cristiano Ronaldo a carregar a selecção às costas. A portugalidade de Terra Franca espreita em quase todas as cenas, incluindo no bigode do senhor Albertino.
Terra Franca dava uma excelente média-metragem, mas falta-lhe direcção para o formato longo. O cinema de Leonor Teles é depurado, mas às tantas isso retira ao filme também alguma objectividade, que o leva a perder-se um pouco. Menos gordura no Cheeserburger e o menu final seria certamente outro.
Título: Terra Franca
Realizador: Leonor Teles
Ano: 2018