| CRÍTICAS | A Caçada

A primeira vez que o cinema se dedicou ao tema de caçadas humanas foi logo em 1932, com o clássico O Malvado Zaroff. Daí temos que dar o salto até aos anos 90, para Presa Mortífera e Perseguição sem Tréguas, para voltar a encontrar algo que valha a pena mencionar. E depois é já no novo século que a coisa entra no mainstream, primeiro com A Batalha Real (o filme sobre caçadas humanas para acabar com todos os filmes sobre caçadas humanas) e depois com a série Os Jogos de Fome.

Eis-nos então em 2020 e perante A Caçada, mais uma variação deste tema. 12 saloios aparentemente aleatórios são levados para a Croácia e colocados à disposição de uma elite, liderada por Athena (Hilary Swank), para os caçar a seu bel-prazer. O problema é que no pacote foi Crystal (Betty Gilpin), confundida com outra pessoa com o mesmo nome. É que esta Crystal é uma ex-marine que serviu no Afeganistão, com a capacidade para a porrada de um John Wick e um arsenal de truques digno de um MacGyver.

De início demoramos um bocadinho a perceber em que terreno nos estamos a mover. É isto uma paródia grotesca como A Batalha Real? Ou é uma alegoria que se leva demasiado a sério, daquelas tipo A Purga, utilizando o gore e a violência gráfica da mesma forma que aquelas pessoas mal-educadas se convencem a si próprias que são “muito honestas, directas e dizem na cara o que têm que dizer”? Nem uma coisa nem outra. Afinal de contas, bastava termos pensado que o realizador Craig Zobel é o mesmo tipo que fez aquele filmaço, Great World of Sound, filme de um humor refinado e, por vezes, até desconfortável, entre o The Office – A Empresa e o This is Spinal Tap.

Zobel vira o bico ao prego e, ao tornar a presa predador, coloca as elites como as vítimas do filme. É a vingança dos 1%, que aqui não são apenas capitalistas maldosos que apenas vêm números à frente. Aqui são todos letrados e cultos, numa tentativa desesperada de serem totalmente inclusivos, mesmo na hora da morte. É por isso que levam para a Croácia um neg…, perdão, afro-americano, para haver representatividade, por exemplo.

Afinal, A Caçada é mesmo uma alegoria sobre a sociedade actual e sobre a consciência de classe. Tudo isto pontuado por uma violência tão estilizada quanto desnecessária, que tanto diverte milhões, como pode distrair um pouco. Mas como é que nos podemos queixar da violência de um filme que termina com uma sequência de pancada entre Betty Gilpin e Hilary Swank de dez minutos, que podia muito bem estar no Kill Bill? E, por falar em Gilpin, a Liberty Belle (olá GLOW) é um achado como action hero. Ficamos à espera de um filme de acção a sério com ela.

Título: The Hunt
Realizador: Craig Zobel
Ano:
2019

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