| CRÍTICAS | Homens e Feras

Homens e Feras é o mais infame filme jamais feito. A história conta-se num só parágrafo. Tippi Hedren e o marido Noel Marshall, activistas da causa animal, decidiram fazer um filme só com leões, que serviria como sensibilização para o problema da caça furtiva em África e da preservação dos felinos. Homens e Feras demorou 11(!) a ser terminado, o casal teve que hipotecar todas as suas poupanças e 70 membros da equipa acabaram atacados pelos leões durante a realização do filme, incluindo o director de fotografia Jan de Bont (esse mesmo, o realizador de Speed – Perigo a Alta Velocidade), que levou 120 pontos e ficou sem escalpe, e a própria filha de Hedren, Melanie Griffith, que quase ficou desfigurada.

No entanto, pior do que todas essas lesões é o facto de que Homens e Feras é… um desastre. Obviamente que todos acabamos por o ver por causa desses ataques (muitos deles acabaram inclusive por ficar na montagem final) e de tudo o resto que rodeou a produção (incluindo inundações e outras catástrofes), mas é difícil encontrar aqui algo que tenha corrido bem. Homens e Feras era suposto ser um dramalhão sobre os caçadores furtivos em África, mas tirando uma cena, já perto do fim, em que dois caçadores acabam dilacerados por um leão (mas que Noel Marshall pede para não contarem à família, para não os preocupar; e não contam!), o filme acaba por ser uma comédia involuntária.

Noel Marshall vive então rodeado de centenas de felinos. Maioritariamente leões, mas também chitas, panteras e tigres. Noel Marshall é o Tiger King antes de haver Tiger King. O seu objectivo é mostrar que conseguimos viver todos em harmonia e que os animais selvagens e os humanos podem coexistir sem serem ameaças uns para os outros. Entretanto, manda vir da América a sua família para viver consigo (a esposa na vida real, Tippi Hedren, os dois filhos verdadeiros, Jerry e John Marshall, e a enteada, a então muito jovem Melanie Griffith ), mas quando eles chegam acabam por se desencontrar.

Homens e Feras é então um long(uíssim)o gag, em que a recém-chegada família à selva vê a sua casa invadida por leões, sem saberem o que fazer. Charlie Chaplin fê-lo. E muito melhor. Temos então leões a saltarem constantemente para cima da família de Marshall, que tentam parecer sempre que está tudo bem, mas estão tão desconfortáveis que rapidamente aquilo se transforma num filme de terror. Se o objectivo era mostrar que os felinos são inofensivos, então o resultado não podia ter sido pior. Depois de ver Homens e Feras não quero nunca ter um encontro imediato com um gato grande. Depois de Hitchcock ter atado Tippi Hedren numa sala cheia de pássaros, numa experiência traumatizante (e até há uma cena que pisca o olho a Os Pássaros), sabe Deus o que a levou a querer repetir a coisa, mas com leões.

Nos anos 70, Hedren, Marshall e os filhos viveram com um leão de estimação, que deu origem a uma sessão de fotografias muito conhecida da Life. Essa reportagem faz muito mais pela sensibilização para a causa animal do que hora e meia de Homens e Feras. O Happy Meal só causa desconforto e curiosidade mórbida, nada mais.

Título: Roar
Realizador: Noel Marshall
Ano: 1981

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