| CRÍTICAS | Que Teria Acontecido a Baby Jane?

Duas das mais brilhantes actrizes da sua geração, rivais irreconciliáveis desde sempre, encontram-se já na fase final da sua carreira para um filme que seria um tudo por tudo para voltarem a ganhar relevância. Como se isso não chegasse, esse filme seria ainda a história de duas irmãs rivais, a viverem com traumas e rancores reprimidos uma pela outra ao longo de décadas. Mesmo que Que Teria Acontecido a Baby Jane? fosse uma treta, teria sempre um lugar na história do cinema, com tantas semelhanças entre realidade e ficção que quase podem ser vistas como meta-referências.

Deixemos as rivalidades e os fait divers entre Joan Crawford e Bette Davis para outro rosário – até porque, para isso, existe a série Feud – e foquemo-nos no filme em si. Que Teria Acontecido a Baby Jane? é a história das manas Hudson. A mais nova, a tal Baby Jane (Bette Davis), foi uma child star durante os tempos do vaudeville, o que granjeou algum rancor por parte da irmã, Blanche (Joan Crawford). Depois veio o cinema e Blanche tornou-se numa estrela do star system, levando a irmã a reboque, que se ia refugiando no álcool. Até que um estranho acidente de carro atirou Blanche para uma cadeira de rodas e deixou as duas refugiadas numa mansão enorme, pertença em tempos de Rudolph Valentino, esquecidas pelo tempo e pelo público, enquanto se alimentam de ressentimento mútuo.

Para quem viu Grey Gardens, estas personagens são familiares. Mais uma vez, a ficção a imitar a realidade… Duas mulheres envelhecidas, mas a viverem ainda presas no passado, numa ilusão de grandeza que as deforma. Aliás, Bette Davis nem sequer tem medo de exagerar nessa deformação até ao grotesco, abusando da maquilhagem. E, claro, isso ressoa na vida das próprias duas actrizes, elas próprias a tentarem manter a relevância dos seus nomes numa Hollywood que definhava e que começava a abrir as portas a novos autores, a novos temas e a novas formas de se fazer (e ver) cinema.

A animosidade entre as duas mulheres é alimentada pela rivalidade que sempre houve entre Crawford e Davis, o que faz com que as personagens secundárias (que vão entrando e desaparecendo do filme logo a seguir) sejam meros figurantes passageiros neste comboio-fantasma. É um thriller psicológico feminino, que vai crescendo numa panela de pressão de suspense e tensão, que há de rebentar num plano final, que é primo do plano final de Crepúsculo dos Deus, o outro hag-exploitation com que Que Teria Acontecido a Baby Jane? partilha a metáfora pela efemeridade da fama.

No final, e apesar da nomeação ao Oscar de Bette Davis, a carreira das duas actrizes não seria propriamente reactivada, mas Que Teria Acontecido a Baby Jane? estabeleceu-se como um dos maiores títulos de ambas. E o thriller psicológico nunca mais foi o mesmo após este McRoyal Deluxe.

Título: What Ever Happened to Baby Jane?
Realizador: Robert Aldrich
Ano: 1962

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