Duncan Jones e a família não autorizaram o licenciamento da música de David Bowie para fazer Stardust – o filme que pretende contar como foi a primeira digressão do camaleão aos Estados Unidos e com isso levou à criação de Ziggy Stardust -, mas isso não demoveu o realizador Gabriel Range. Que raio!, um filme sobre David Bowie sem música de David Bowie? A última vez que vimos um biopic não autorizado (alguém mencionou Jimi: All Is By My Side) a coisa não correu propriamente bem.
Mas depois pensamos melhor e, quer dizer, se fizeram um filme sobre a morte de Ziggy Stardust, também sem a música de Bowie, porque é que não haveremos de dar uma chance a Stardust? Nem que o encaremos como uma espécie de prequela não oficial de Velvet Goldmine.
Stardust situa-se por alturas do lançamento de The man who sold the world, disco que seria um fiasco de vendas e que não cumpria o que Bowie prometera com o debutantes Space Oddity. Do outro lado do Atlântico a coisa ainda era mais exasperaste, já que ninguém tinha mais paciência para hippies em vestidos de mulher. Mas Bowie mantinha-se convicto que estava destinado a ser uma estrela mundial e isso só seria possível caso triunfasse do outro lado do Atlântico. Por isso, com a ajuda da teimosa (e extremamente estereotipada) esposa, lá convence a Mercury Records a pagarem-lhe uma viagem para uma mini tour nos Estados Unidos.
Contudo, ao chegar aos Estados Unidos, as coisas são um pouco diferentes do que esperava. Bowie nem sequer tem um visto que o permita dar concertos, vai dar apenas umas entrevistas numas rádios manhosas, uns showcases em convenções de aspiradores e fica a dormir na casa da mãe do road manager, Ron Oberman (Marc Maron). Contudo, a viagem vai permitir-lhe magicar a criação do seu alter-ego Ziggy Stardust, que no disco seguinte o iam catapultar para o topo das tabelas de vendas. E como? Como um flirt mais ou menos traumático com a loucura, que algo genético da família Jones.
Portanto, Stardust não tem nada de biopic convencional, daqueles que se limitam a enumerar um determinado número de best ofs, procurando antes captar a pessoa em vez do artista. E isso é sempre de louvar. Infelizmente, Gabriel Range parte logo em desvantagem para esta luta, porque não tem uma arma importante para se bater de igual para igual: a música. Mas nem por isso desiste e vai à briga.
Stardust não é propriamente bem-sucedido nos seus intuitos, mas também não é o desastre como muitos o pintaram. É estereotipado? Sim. Range cai em todos os clichés possíveis quando tenta ilustrar o lado mais simbólico de Bowie (ai aquele sonho inicial com o astronauta…)? Sim. Johnny Flynn é um David Bowie algo… problemático? Sim sim sim. Mas Stardust não pode ser acusado de não tentar. Até porque se compreende ao longo filme o amor de Gabriel Range pela obra do músico. E aquele diálogo entre Bowie e Oberman sobre Vince Taylor e Iggy Pop faz mais pelo filme do que toda a hora e meia seguinte. Enfim, um Cheeseburger, se bem que reconheço aqui neste meu gesto uma considerável dose de condescendência.
Título: Stardust
Realizador: Gabriel Range
Ano: 2020