Imaginem uma realidade alternativa onde as pessoas sejam incapazes de mentir. É um mundo igualzinho ao nosso, mas onde todos dizem apenas a verdade absoluta. Não existem partidas, mentiras, enganos, bajulações e ficção, todos dizem exactamente aquilo em que pensam e que têm para dizer. Por isso, os anúncios na televisão são apenas um tipo a pedir às pessoas encarecidamente para as pessoas comprarem o seu produto, os filmes são apenas documentários em que o narrador lê um livro de história e os anúncios da Pepsi dizem apenas para quando não há Coca-Cola.
Já houve outros filmes que exploraram uma premissa semelhante, ambos com Jim Carrey curiosamente (alguém mencionou O Mentiroso Compulsivo e Sim?), mas nenhum levou essa ideia tão ao extremo quanto A Invenção da Mentira. Ricky Gervais cria toda uma sociedade totalmente atada à verdade e a conclusão que tira é assustadora: seria um mundo tão aborrecido, quanto depressivo, onde todos estariam resignados a sua condição no mundo. Afina, a mentira é o sal da vida.
Ricky Gervais acaba de ser despedido do seu trabalho como argumentista, a mulher da sua vida (Jennifer Garner) não quer nada consigo porque não quer filhos feios e prepara-se para ser despejado porque não tem dinheiro para a renda. Até que, em desespero, tem uma ideia genial: mentir. E, de repente, tudo se torna possível. O banco dá-lhe dinheiro, as pessoas passam a adorar os seus guiões fictícios e Jennifer Garner… bem, Jennifer Garner fica só mais sua amiga, porque continua a não querer filhos feios.
A primeira parte de A Invenção da Mentira é divertidíssima e explora na perfeição aquele que tem sido o tema favorito do corpo de obra de Gervais: a fatalidade da vida. Com um naipe de secundários de topo (Jonah Hill em modo suicida, Louis CK em modo bebedolas, Edward Norton em modo polícia cocainómano e Ron Lowe em modo galã odiável), A Invenção da Mentira começa a se enfiar num beco sem saída à medida que as mentiras de Gervais continuam a aumentar e ele começa a não conseguir suportar tanto fardo. Principalmente quando diz que há um homem no céu que manda nisto tudo e tem que criar toda uma narrativa que explique todo o inexplicável.
No último terço, A Invenção da Mentira é já só uma comédia romântica de bom coração, mas em que Gervais pede Jennifer Garner em namoro vezes demais, insistindo apenas para não se casar com Ron Lowe. Faltou-lhe ali um pouco mais de trabalho de escrita de guião, para que a segunda parte tivesse a qualidade da primeira e o filme respondesse à pertinência da premissa com o valor que ela pedia. Mesmo assim, o McBacon tem mais coisas recomendáveis do que… irrecomendáveis?
Título: The Invention of Lying
Realizador: Ricky Gervais & Matthew Robinson
Ano: 2009