No início há um anúncio de jornal e uma entrevista de emprego a vários candidatos. Uma qualquer empresa, da qual nunca temos suficiente informação, procura um velhinho que possa agir como agente infiltrado num lar de idosos, para aferir das condições de como é tratada uma das utentes. A premissa é desde logo… suspeita (para não dizer bizarra) e esse é o principal tom de El Agente Topo, documentário tresmalhado de ficção (ou será o oposto?).
Sergio Chamy é então o escolhido e a primeira parte de El Agente Topo é dedicada ao seu treino. Chamy é colocado a par da sua missão, ensinam-lhe a trabalhar com o smartphone (enviar mensagens de voz, tirar fotos, fazer chamadas por vídeo… tudo tarefas hercúleas para quem não nasceu na era digital e é um pouco info-excluído) e até lhe dão uns óculos que filmam incognitamente. Depois, este agente Clouseau é enviado por três semanas para um lar de idosos, em busca de provas que denunciem possíveis maus tratos a uma utente em específico, enquanto que uma equipa de filmagem já lá está a documentar o dia-a-dia da instituição.
El Agente Topo é um docudrama, que ficciona uma situação hipotética para pintar um retrato naturalista do quotidiano de um lar de idosos. Nunca percebemos bem onde é que termina a parte ficcionada e onde começa a parte documental, mas quando damos por nós já estamos imersos naquela realidade, que vai lidar com seniores solitários, outros com demência e outros com a saúde mental fragilizada.
A realizadora Maite Alberdi tem trabalhado, na sua filmografia anterior, com esta realidade e com este público. El Agente Topo volta a mergulhar na sua privacidade, para retratar uma comunidade que é, muitas vezes, tornada invisível na nossa sociedade, especialmente através destas instituições. Sob o pretexto de estar à procura de sinais de abuso de autoridade, Sergio Chamy – e, com ele, nós vamos de arrasto também, claro – acaba por mergulhar nas vidas daquelas pessoas e os seus problemas tornam-se os nossos também.
Não deixa de haver um sentimento de invasão de privacidade em El Agente Topo, especialmente quando assistimos a momentos de maior fragilidade mental por parte dos utentes. Especialmente porque, ao seguirmos Sergio Chamy na sua missão de agente infiltrado, sabemos que os seus intuitos têm outros objectivos. É, por isso, um filme agri-doce, com a delicadeza da experiência da vida, mas também com a solidão dos últimos dias. Uma vez, em entrevista, a propósito do seu centenário, perguntaram a Manoel de Oliveira como era ter 100 anos, ao que ele respondeu que era ver todos os amigos a morrer. El Agente Topo consolida em filme essa frase, mas com um sentimento de invasão de privacidade. Óptimo documentário, mas com um mecanismo algo errado, o que explica o Cheeseburger.
Título: El Agente Topo
Realizador: Maite Alberdi
Ano: 2020