Já todos vimos cinema suficiente para saber bem como é o ambiente social e familiar em que vive Celia (Andrea Fandos), a protagonista de Raparigas. Celia estuda num colégio católico de freiras e esse ambiente rígido e conservador projecta-se em casa, onde vive com a mãe. No fundo, é aquilo que temos visto ao longo das décadas, de As Virgens Suicidas a Mustang.
Celia aproxima-se da puberdade, aquela altura em que a vida dos adolescentes fica de pernas para o ar, e acaba por ser estimulada ainda mais pela chegada à escola de uma figura estranha. Brisa (Zoe Arnao) é uma nova miúda que acaba de chegar de Barcelona e que, como os opostos se atraem, se vai tornar em bff de Celia, introduzindo-a ao tabaco, às saídas à noite, às roupas mais diferentes e, sobretudo, ao roquenróle (o dos Heroes Del Silencio ou os Niños Del Brasil, que enchem a banda-sonora), essa criação do demo que continua a desencaminhar gerações e gerações de jovens todos os anos.
Raparigas é então um filme de passagem e um coming of age, um tema recorrente no cinema com jovens. A realizadora Pilar Palomero procura filma-lo sem pressas e sem forçar nada, optando por se limitar a observar ao invés de atirar pedrinhas para a engrenagem. Isso faz com que vá mexer com temas sensíveis, como o bullying na escola, o estigma de ter uma mãe solteira num ambiente social conservador ou a religião de raiz judaico-cristã (a culpa, sempre a culpa), mas sem nunca os explorar a fundo. Raparigas torna-se então um daqueles filmes em que parece nada acontecer para quando nos apercebermos já estar tudo diferente.
Depois de ter limpado os Goya deste ano, havia alguma expectativa em redor do filme, mas Raparigas não consegue nunca o golpe de asa que lhe permita levantar voo definitivamente. No entanto, chega ao seu destino sem percalços de maior, há hora marcada e sem incidentes de maior, o que, por vezes, é tudo o que pedimos. Quem é que nunca teve aquele desejo íntimo de encomendar um Double Cheeseburger?
Título: Las Niñas
Realizador: Pilar Palomero
Ano: 2020