| CRÍTICAS | Pig

Sempre que alguém acaba de ver um dos últimos filmes do Nicolas Cage e comenta este é o filme mais estranho de sempre do Nicolas Cage, o próprio, independentemente de onde esteja, dá um último gole na fresquinha que está a beber e pede à pessoa mais perto: hold my beer. Depois vai ao escritório e começa a folhear argumentos que tem para lá empilhados, até escolher outro ainda mais bizarro.

É que tem sido assim dos últimos anos. Ora vejamos: depois da extravaganza de heavy metal e gore místico de Mandy, veio o body horror cósmico lovecraftiano de Color Out of Space e, logo a seguir, o combate pela sobrevivência com uns desenhos-animados possuídos em Willy’s Wonderland. E reparem que estou a ignorar de propósito o Jiu Jitsu, a xungaria pesada com semi-deuses extraterrestres que descem à Terra para ensinar jiu jitsu a humanos escolhidos pelos seus atributos físicos, porque não quero contribuir para qualquer tipo de popularidade daquele que é o filme de Nicolas Cage com a pontuação mais baixa no imdb.

Depois de tudo isto, Pig ainda consegue levantar mais a fasquia de bizarria. Aqui, Cage é um eremita que vive sozinho com um porco, que se chama precisamente… Porco, e que encontra trufas como nenhum outro. Esse é precisamente o último vínculo de Nicolas Cage com a civilização, já que semanalmente vai lá um tipo a casa (Alex Wolff) levar-lhe mantimentos, em troca das trufas. Até que uma noite, alguém arromba a porta e rouba-lhe o porco. Big mistake!

Nicolas Cage regressa então à civilização com uma sede de vingança, mas se todos esperávamos um novo John Wick, então o realizador Michael Sarnoski não se podia divertir mais em nos gorar as previsões. É que, contra todas as expectativas, começamos a ser levados para dentro de um mundo totalmente subterrâneo e obscuros de chefs, alta cozinha e experiências gastronómicas altamente requintadas. Ou seja, do vengeance movie ao Comer, Orar, Amar em apenas três passos. Ou John Wick goes Ratatui.

Primeiro há um Clube de Combate a operar numa cave abandonada de um hotel de luxo, em que cozinheiros, empregados de mesa e pessoal da copa se socam e pontapeiam ferozmente. Tudo tão aleatório, quanto inconsequente. Nicolas Cage, em tempos, foi um dos nomes mais respeitado deste universo, mas como se retirou para nunca mais voltar, a única coisa que ficou no seu lugar foi uma reputação que o precede. Agora, neste seu regresso, há algo mais de crístico nele do que de filho pródigo, na forma como ele faz os seus inimigos repensarem as suas vidas, os seus objectivos e os seus futuros.

Pig é precisamente um filme sobre isso e sobre as expectativas familiares, de como elas podem interferir e influenciar o nosso destino. Como é que isto está relacionado com um porco que encontra trufas raptado? É pouco claro. Mas Nicolas Cage veste a camisola (aliás, isso é algo de que nunca o podem acusar) e saca um filme num pouco habitual registo contido, provando aos mais cépticos que sim, ainda sabe representar. Por sua vez, Michael Sarnoski filma tudo com uma segurança inesperada, como se soubesse exactamente o que está a fazer e a querer dizer. Mas não tenho bem a certeza que o saiba realmente. Não vou correr riscos, fico-me pelo Happy Meal.

Título: Pig
Realizador: Michael Sarnoski
Ano: 2021

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