Os mitos urbanos são uma das últimas formas de tradição oral que permanecem na civilização ocidental, perpetuando-se de geração em geração, à medida que vão sendo actualizados aos tempos que correm. Histórias mais fantásticas como evocar a Bloody Mary ao espelho ou outras mais realistas (ou, pelo menos, mais possíveis) como o tipo que acordou na banheira cheia de gelo sem um rim são clássicos comuns a quase todos os países. E, claro, toda a gente conhece alguém que sabe de alguém que uma vez lambeu um selo e depois nasceu-lhe aranhas numa ferida que tinha na língua.
Os mitos urbanos têm sido um dos principais combustíveis do cinema de terror desde sempre, seja de forma mais directa, como Slender Man, seja como inspiração mais livre, como um O Caçador de Sonhos ou Sei o Que Fizeste no Verão Passado. No entanto, nenhum filme levou esse tópico tão a sério quanto Mitos Urbanos, o slasher em que um serial killer despacha as suas vítimas de acordo com… lendas urbanas. E o incrível é que nenhuma delas vai incluir uma carrinha branca, esse clássico que faz parte de todos os boatos em Portugal.
Mitos Urbanos surgiu assim no rescaldo do sucesso de Gritos e, tal como esse, propõe uma abordagem quase meta-referencial aos códigos do género. No entanto, enquanto que o filme de Wes Craven assumia as referências de filmes de décadas de história de cinema de terror, este assume essa tradição oral que é a base de muitas das histórias de sustos, seja quando são contadas à fogueira num acampamento, seja quando são contadas num grande ecrã numa sala de cinema.
A entrada do filme é, de longe, o melhor de Mitos Urbanos. Uma jovem viaja de carro e, ao parar para abastecer numa boa de gasolina, é atacada por um tipo sinistro. Ou, pelo menos, assim parece, porque depois há um twist, que faz com que o prólogo de Mitos Urbanos pudesse ser um daqueles episódios curtos de Alfred Hitchcock Apresenta, essa instituição da ficção de suspense e terror. Ficam então lançados os dados para mais um slasher com muitos adolescentes com as hormonas aos saltos, em que o assassino usa uma parka de inverno felpuda e um machado, e vai despachando adolescentes e corpo docente – onde se inclui o professor Robert “Freddy Krueger” Englund, que é mais uma meta-referência ao cinema de género – de forma regular.
Apesar do realizador Jamie Blanks não ter problemas em carregar no gore, nenhuma das cenas seguintes de Mitos Urbanos equipara a inicial e, por isso, todo o resto do filme é sempre a descer. Ao menos consegue manter a identidade do assassino em até ao final, se bem que depois os seus motivos são um pouco… duvidosos. Mas o objectivo principal de Mitos Urbanos não era especificamente montar um grande filme, mas antes explorar uma ideia e um conceito especifico. Aposto que se tivessem usado um mito urbano com uma carrinha branca no final saberia melhor do que um Cheeseburger.
Título: Urban Legend
Realizador: Jamie Blanks
Ano: 1998