| CRÍTICAS | Tick, Tick… BOOM!

Manuel Lin-Miranda é, actualmente, um dos nomes mais requisitados de Hollywood. Depois de ter conquistado a Broadway, especialmente após Hamilton, e coleccionado Tonys, Grammys ou Pullitzers, o americano de origem porto-riquenha chegou ao grande ecrã, compondo para tudo o que é musical, incluindo a Disney, e vendo os seus musicais serem adaptados ao grande ecrã (olá Ao Ritmo de Washington Heights, como estás?). Agora é a vez de se estrear como realizador, com um filme que provocou um leilão intenso entre distribuidoras, e que acabou por ser ganho pela inevitável Netflix.

No entanto, este Tick, Tick… BOOM! é um biopic (pouco convencional) de outro nome forte da Broadway – o de Jonathan Larson, o autor e compositor que morreu precocemente aos 35 anos, mas que deixou marca profunda nos palcos e no musical, mostrando-nos que este é um género que pode ser também sobre pessoas comuns. Tick, Tick… BOOM! é então um musical sobre fazer um musical baseado no musical homónimo e auto-biográfico a solo do próprio Larson.

O tick tick do título é o barulho que o relógio faz ao aproximar-se do 30º aniversário. E quanto mais próximo da data está, mais este se torna ensurdecedor para Larson, que continua a batalhar para conseguir encenar a sua primeira obra: uma ópera-rock distópica sci-fi. E tendo em conta que Stephen Sondhein, a sua figura tutelar (e que há de ter mesmo presença física, no corpo de Bradley Whitford), teve a sua primeira obra na Broadway aos 27 anos, a pressão torna-se ainda maior. Por isso, na véspera de uma leitura encenada da sua obra para uma plateia de produtores e convidados, Larson não consegue lidar com tudo e acaba por secundarizar as suas próprias relações pessoais (o melhor amigo, Robin de Jesus, com a ameaça da Sida a pairar, e a namorada, Alexandra Shipp, com uma proposta para ir trabalhar para longe). A arte em detrimento da vida. Mas poderá a primeira existir sem a segunda?

Tudo isto é recriado em reconstituições que irrompem em cantoria a qualquer momento, ao mesmo tempo que são narradas pelo próprio Jonathan Larson (ou seja, Andrew Garfield, que canta todos os seus números com voz de anjo, revelando uma nova faceta) em palco, como se Lin-Manuel Miranda estivesse a emular o espectáculo de teatro homónimo. É um simulacro dentro do simulacro, que assume o artifício da mesma forma que o musical estabelece um compromisso de inverosimilhança com o espectador sempre que uma cantiga irrompe e toda a gente desta a dançar de forma coordenada.

E, claro, como qualquer musical, são as canções que ditam verdadeiramente se este é um bom ou um mau filme. E elas são impecáveis. Naboa tradição de Sondheim, com óptimas letras, mas não necessariamente coreografias muito elaboradas, a banda-sonora de Tick, Tick… BOOM! segue o mesmo registo mais realista e intimista das obras de Larson, em detrimento do barroquismo e da grandiloquência do musical clássico da Broadway. Ganha o espectador em identificação e ganha o filme em McRoyal Deluxe, mesmo que haja muitas vezes um tom de bazófia que o pode afastar de alguns espectadores.

Titulo: tick, tick… BOOM!
Realizador: Lin-Manuel Miranda
Ano: 2021

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