Em 2008, Roland Emmerich fez uma daquelas xungarias desmioladas dele chamada 10 000 A. C., que era um survival movie pré-histórico, em que um homem das cavernas lutava com tigres dentes-de-sabre(!) e com monstros(!!). Era tão pateta que era fun, fun, fun. Por isso, quando Scott Beck e Bryan Woods decidem fazer um remake não oficial de 10 000 A. C., mas com um extraterrestre(!) em vez de um homem pré-histórico, a última coisa que esperaríamos é que fosse uma seca. É que 65 (o título vem de 65 milhões de anos atrás, período da Terra em que nem sequer havia mamíferos) é sisudo e protocolar, levando-se tão a sério que até parece que não estamos a falar de um filme em que um homem com metralhadoras luta contra dinossauros(!).
Adam Driver é então um astronauta do planeta Somaris (as semelhanças com Solaris ficam-se pelo nome) que se despenha na Terra, 65 milhões de anos atrás. Da sua tripulação só sobrevive Koa (Ariana Greenblatt, com maquilhagem perfeita durante todo o filme), uma jovem que nem sequer fala a sua língua. Os dois vão ter que subir uma montanha, onde está a cápsula de fuga que eles permitirá sair daquele planeta, mas pelo caminho há centenas de dinossauros que os querem comer. Parece que a Terra há 65 milhões de anos atrás era tipo a Austrália, mas com animais supervitaminados. Ah, e têm que o fazer em poucas horas, porque há um meteoro que se encaminha perigosamente para a Terra. lembram-se daquele meteoro que deu cabo dos dinossauros? Exacto, é esse mesmo.
Adam Driver tem uma metralhadora com munição infinita. E os dinossauros nem sequer são realistas, uma vez que Beck e Woods decidiram que, num filme como este, era mais giro ter monstros mais assustadores. Por isso, não se compreende como é que 65 não tem um pingo de sentido de entretenimento ou de diversão. Com um argumento altamente esquemático, em que as peripécias surgem e são ultrapassadas a mesma velocidade com que bocejamos, rapidamente o filme entra numa lógica de jogo de computador e de ultrapassagem de obstáculos. A cena em que Adam Driver cai de uma árvore e desloca um ombro é ridícula e a parte em que ele fica preso numa gruta, mas depois Koa assobia e, afinal, ele só tem que voltar calmamente para trás, saindo pela porta, nem sequer é compreensível.
Por isso, se estavam à espera de um Parque Jurássico com armas (eu estava… eu sei, sou ingénuo), podem tirar o cavalinho da chuva. É certo que anda lá uma espécie de V-Rex (aquele predador alfa do King Kong, de Peter Jackson) e até uns raptors, mas podiam ser cães e gatos que iria dar ao mesmo. Tudo é amorfo e incaracterístico em 65, que ainda por cima aposta tudo numa espécie de moralismo new-age, que se traduz nos flashbacks no planeta Somaris (que é, pura e simplesmente, uma praia com um pôr-do-sol permanente e uma banda-sonora lamechas) e com a filha (Chloe Coleman).
Sim, porque 65 ainda tem um sub-enredo que envolve o trauma de perder uma filha. É por isso que Adam Driver vai abraçar ainda com mais força aquela aventura de levar Koa sã e salva de volta ao seu planeta de origem. Até porque Pedro Pascal, especialista em acompanhar órfãos em aventuras perigosas, deveria estar ocupado a filmar a segunda temporada do The Last of Us. Por isso, o Pão com Manteiga de 65 só não é 100 por cento inútil porque serve sempre como mau exemplo. Malta da xungaria, se querem saber o que nunca fazer, ponham os olhos nisto.
Título: 65
Realizador: Scott Beck & Bryan Woods
Ano: 2023