| CRÍTICAS | Run Rabbit Run

Birth – O Mistério podia não ser um grande filme, mas tinha alguns dos momentos mais perturbadores do cinema de terror de… sempre? Tudo por causa duma criança que tentava convencer a mãe que era o falecido pai reencarnado. Havia uma cena em que Nicole Kidman lhe dava banho que se tornava realmente incómoda. Run Rabbit Run, produção australiana para a Netflix, tem o mesmo efeito. Aqui, Mia (Lily LaTorre) procura convencer a mãe de que é a sua irmã, falecida quando ambas eram crianças.

Sarah é a mãe e a verdadeira protagonista de Run Rabbit Run. Aparentemente tudo corre bem na sua vida: uma casa generosa, uma profissão de sucesso, uma filha saudável e, apesar de divorciada, parece manter uma relação saudável com o pai da filha e a nova namorada deste. Mas, aos poucos, a realizadora Daina Reid vai-nos dando alguns sinais de que há algo mais por trás daquela fachada de normalidade. A forma como reage violentamente quando o enteado aleija a filha, as caixas com as coisas do pai recentemente falecido que continuam empilhadas na garagem por arrumar e uma relação problemática com a mãe, que insiste em ignorar.

Daina Reid nunca revela tudo de uma vez e o ritmo demorado e reflexivo de Run Rabbit Run contribuem para irem aumentando um certo ambiente de paranóia. Depois vão sendo acrescentados à panela de pressão alguns elementos sobrenaturais. Por vezes, Run Rabbit Run faz mesmo lembrar David Lynch, na forma como sentimos que não estamos a perceber nada, mas há sempre uma ideia forte de que o que estamos a ver é muito importante para o resto do filme. Há um coelho que surge misteriosamente à porta de casa que funciona quase como elemento simbólico e tutelar destes momentos.

E, por fim, há ainda a própria Austrália, que é fundamental para o sucesso de Run Rabbit Run. A vastidão e o isolamento da paisagem down under contribuem decisivamente para criar o tal ambiente de vastidão e desolação, que começam a confundir-se com o estado de espírito de Sarah Snook. São inevitáveis as comparações com o Walkabout, de Nicolas Roeg, e isso inscreve automaticamente Run Rabbit Run numa tradição de cinema australiano que lhe fica bem.

Apesar de alguns solavancos e um par de passadas em falso, Run Rabbit Run é uma eficaz história de fantasmas e uma viagem pela paranóia pessoal de uma mulher/mãe/filha, que nunca temos a certeza de ser real ou de ser apenas no interior da sua cabeça. E, no fim, ainda tem o bom senso (e bom gosto) de manter tudo em aberto, com um plano final tão misterioso quanto dúbio, que remata na perfeição o seu McRoyal Deluxe.

Título: Run Rabbit Run
Realizador: Daina Reid
Ano: 2023

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