| CRÍTICAS | Lavender

Há uma cena de abertura em Lavender que coloca a fasquia alta: no interior d uma casa, a polícia encontra os corpos de uma família em poças de sangue e uma das filhas sentadas a um canto, a tremer e a segurar uma navalha da barba. Depois Lavender dá um salto de 20 anos e arranca realmente.

O realizador Ed Gadd-Donnelly nunca nos dá informações de forma directa (nem completa) e deixa-nos ir recolhendo tudo o que necessitamos saber aos poucos e poucos. Jane (Abbie Cornish) é a miúda da cena de abertura e agora é mãe de uma criança, a viver os últimos cartuchos de um casamento com Alan (Diego Klattenhoff) e com uma carreira bem sucedida como fotógrafa, com um corpo de trabalho baseado em casas antigas e desocupadas. Aparentemente, Jane não só não se lembra do que aconteceu há 20 anos atrás, como reprimiu tudo tão lá no fundo que nem sequer sabe como foi a infância.

É difícil aguentar tanta suspensão da descrença perante uma mulher adulta que, quando era criança, viu os pais e a irmã a serem chacinados (ou se calhar até foi ela que os matou, quem sabe…) e hoje em dia não tem a mínima ideia de que esse episódio aconteceu, mas estamos dispostos a fingir que conseguimos engolir isso e dar-lhe uma oportunidade. Jane começa então a ter visões e a encontrar objectos estranhos em locais inesperados e, de repente, entramos no território do thriller psicológico. Mas as coisas não se ficam por aí. Jane tem ainda um acidente de viação e fica com amnésia. De repente, a sua vida actual e a infância reprimida começam a cruzar-se, os fantasmas misturam-se com o trauma e ha não sabemos bem o que é a realidade e o que existe apenas dentro da sua cabeça.

Lavender parece claramente que começou pelo fim. Ed Gadd-Donnelly teve uma ideia de como queria que o filme terminasse e começou a construir uma história que desembocasse aí. Foi reunindo ideias e, sem riscar nenhuma delas, foi apertando-as bem para que coubessem todas. Lavender é, no entanto, um fato de tamanho M, que alguém demasiado grande forçou a vestir, ficando com as calças à peixe-peixe e as mangas acatitadas. E, como se isso não chegasse, depois de desatar a trama, ainda nos atira um twist para arrumar os elementos todos. Contudo, o que estava preso com cuspo acaba por se desmoronar como um castelo de cartas. Um desanimador Happy Meal.

Título: Lavender
Realizador: Ed Gass-Donnelly
Ano: 2016

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *