Desde que apareceu com A Casa do Diabo até ao lançamento do díptico X e Pearl, Ti West viveu num limbo de uma dúzia de anos em que parecia que ia ser sempre uma promessa por cumprir do cinema de terror. Os seus filmes continuavam sempre a prometer muito, com boas ideias e um estilo slow burner muito pessoal, mas sempre demonstrando um grande sentido de cinefilia pelo género, mas nunca chegavam a confirmar os indícios. Não é que X seja grande espingarda (Pearl é melhor, mesmo sem deslumbrar), mas ao menos trouxe finalmente algum reconhecimento da crítica e da bilheteira.
The Sacrament foi um dos passos dessa carreira enquanto ia prometendo decolar, mas sem levantar nunca voo: um found footage baseado no massacre de Jonestown (o culto do reverendo Jim Jones, que culminou com um suicídio (homicídio?) em massa na Guiana), que aparecia na mesma altura que os true crime documentaries começavam a ser uma tendência forte nos serviços de streaming. Aqui, três jornalistas da Vice, a revista provocativa que gosta de escarafunchar nas margens da cultura popular e do lifestyle alternativo, sempre em busca de um bom escândalo pop (Joe Swanberg, AJ Bowen e Kentucker Audley), viajam para uma misteriosa comunidade no meio do mato, lideradas pelo ainda mais misterioso Pai (Gene Jones, que partilha curiosamente o nome com o próprio Jim Jones, pelo menos foneticamente), onde uma série de ex-toxicodependentes, ex-alcoólicos e ex-rufias vão para se reabilitar numa vida mais próxima de Deus.
O Eden Parish, o nome da tal comunidade, é um decalque de Jonestown e basta conhecer minimamente a história que chocou o mundo em 1978 para saber como vai terminar o filme. Ti West não procura inventar nem criar nada de novo e, por isso, o seu estilo demorado é aqui uma espécie de tiro de pólvora seca. Seja como for, o que interessa aqui é o processo e não o ponto de chegada, por isso suportamos relativamente bem The Sacrament, nem que seja por ser um filme curto.
Tal como em Midsommar – O Ritual, sentimos logo à chegada à comunidade um sentimento de estranheza. Sabemos que algo vai correr mal, só não sabemos o quê. Quer dizer, aqui sabemos exactamente o que vai acontecer. No entanto, a forma como Ti West resolve as coisas é tão apressada que ficamos a questionar-nos se não teremos adormecido e deixar passar alguma coisa. Na vida real, Jones ordenou o “suicídio colectivo revolucionário” depois de se ter visto num beco sem saída, com a morte de um deputado e a investigação do FBI e das finanças americanas; em The Sacrament, o Pai ordena o suicídio colectivo depois de três jornalistas terem visitado o local e alguns locais tentarem fugir. Parece muito pouco para desistir tão rapidamente. Faz lembrar aquele episódio do South Park, em que eles ficam retidos na escola com um nevão e, ao fim de 15 minutos, decidem sacrificar um deles e submeterem-se ao canibalismo porque estão com larica e precisam de um lanche.
E depois há o found footage. Este é um truque que ajuda a incluir realismo e uma aura de “evento real” aos filmes de terror, mas Ti West cai na fácil tentação de encenar tudo demasiado, esvaziando rapidamente o efeito, com campos e contracampos, planos de corte e demais exemplos de cinematografia. Ao fim de não sei quantas décadas de found footage, é incrível ver que Holocausto Canibal e O Projecto Blair Witch continuam a ser os moldes a seguir. The Sacrament é um Cheeseburger que se come de uma dentada só.
Título: The Sacrament
Realizador: Ti West
Ano: 2013