Mortal Kombat foi um fenómeno dos jogos de vídeo nos anos 90, que marcou a sua altura. O jogo era um beat ‘em up que melhorava os gráficos de Street Fighter, o outro clássico do género, e adicionava-lhe um ingrediente novo: o gore. Parecia um pormenor mínimo, mas fazia toda a diferença.
Curiosamente, os dois jogos chegaram ao cinema quase ao mesmo tempo: Street Fighter em 1994 e Mortal Kombat em 1995. Não foram a primeira adaptação cinematográfica de videojogos de porrada, porque antes já houvera Double Dragon, mas são poucos os que querem lembrar-se disso. No entanto, Combate Mortal soube olhar para Street Fighter – A Batalha Final, perceber porque é que falhou na bilheteira e corrigir a abordagem.
E, mais uma vez, foi o gore a pequena grande diferença entre ambos. Quer dizer, não que Combate Mortal tenha qualquer gore, até porque é um PG13 (algo que o reboot de 2021 procurou emendar), mas é que soube manter-se fiel ao espírito do jogo. Primeiro, não procurou criar um fio narrativo muito complicado, que depois exigisse muita liberdade dramática para tapar s buracos e fazer sentido, apostando antes numa fórmula básica que permitisse apenas recriar algumas cenas reconhecíveis do jogo (falas dos personagens, como as irónicas flawless victory ou finish him) ou as imagens de marca das personagens, nos seus golpes especiais ou fatalities; e depois criou um mundo negro e sinistro, onde se mistura fantasia, ficção-cientifica e terror, fiel à atmosfera do Mortal Kombat, ao contrário do aspecto colorido e cartunesco de Street Fighter – A Batalha Final.
O argumento de Combate Mortal é então o de Força Destruidora (que, por sua vez, já era uma variação de O Dragão Ataca): os melhores lutadores da Terra são “convidados” para um torneio mortal contra os representantes do Outworld, estando em jogo o destino do planeta. Por isso, não se entende porque é que os representantes terráqueos são recrutados por Shang Tsung (Cary-Hiroyuki Tagawa), o arauto dos maus. Mas isso também não interessa nada, até porque as regras do torneio estão sempre a mudar ou chegam mesmo a ser contraditórias. Porque é que quando Liu Kang (Robin Shou) luta contra Kitana (Talisa Soto), o combate termina sem uma morte? Não é isto um torneio… mortal? E, já agora, é impressão minha ou Johnny Cage (Linden Ashby) é atacado pelo Scorpion (Chris Casamassa) quando está a passear na floresta? Ou aquilo foi um combate oficial?
Há muitas personagens retiradas do jogo, para deleite dos fãs, se bem que é difícil entender porque é que Reptile é um bicho feito em (muito) mau CGI. Também Raiden, o protector da Terra, é uma versão higienizado do “Raiden” de As Aventuras de Jack Burton nas Garras do Mandarim. No entanto, como é interpretado por Christopher Lambert, a estrela da companhia, acabamos por aceitar a decisão sem muitas queixas.
Liu Kang, Sonya Blade (Bridgette Wilson-Sampras) e Johnny Cage acaba, então por ser as personagens principais do filme e são eles que vão ter todas as cenas de porrada. É certo que são todas torpes e nenhuma propriamente memorável, mas como o filme procura ser o mais fiel possível ao jogo, isso chega-nos. E como não gostar de Goro, o gigante de quatro braços que é o campeão do Outworld e que é um animatronic apenas com duas expressões faciais e que só consegue levantar os braços, o que faz com que esteja sempre a festejar qualquer coisa. No entanto, a grande estrela de Combate Mortal é a banda-sonora, uma colecção de temas maus de trance (repararam no pleonasmo?), que se transformaram na imagem de marca do filme. Alguém viu o Corre, Lola, Corre e percebeu como essa música marcava o ritmo do filme. Combate Mortal é um clássico xunga que lançou ainda a carreira do realizador Paul W. S. Anderson e o seu Cheeseburger continua a ser o melhor de toda a série.
Título: Mortal Kombat
Realizador: Paul W. S. Anderson
Ano: 1995
Combate Mortal acabou por ser um sucesso de bilheteria, mesmos sendo um arraial de xungaria, o que justificou a produção de uma sequela. E os produtores procuraram não inventar muito, seguindo a mesma estratégia do Mortal Kombat 3: a de acumulação. Ou seja, mais personagens e mais gore gratuito. Quantidade em vez de qualidade. O que se esqueceram é que Mortal Kombat 3 não teve, nem de perto nem de longe, o sucesso do jogo anterior.
Na verdade, a margem de manobra de Combate Mortal já era mínima. Além disso, Combate Mortal 2 – Aniquilação já não podia contar com o factor surpresa, que todos os fãs procuravam no primeiro filme, já que todos já tinham visto os seus personagens favoritos de carne e osso. Por isso, Combate Mortal 2 – Aniquilação tinha tudo para correr mal. Plot twist: correu mal!
Combate Mortal 2 – Aniquilação pega exactamente onde o antecessor terminara: depois de ter perdido o torneio esotérico de artes marciais pelo domínio da Terra, o Imperador decide ignorar as regras e invade o nosso mundo na mesma. Cabe mais uma vez aos campeões de Rayden, o Deus protector da Terra, salvarem a honra do convento Só que desta vez vale tudo. Verdade seja dita, da primeira vez também foi mais ou menos assim, já que as regras eram constantemente infringidas.
Robin Shou e Talisa Soto regressam como Liu Kang e Kitana. Sandra Hess é a nova Sonya Blade, o que é bom porque Bridgettte Wilson-Sampras havia sido um erro de casting. E Johnny Cage também é substituído por Chris Conrad, se bem que este morre logo nos primeiros minutos. Sim, é um spoiler, eu sei, mas se decidir não ver o filme por causa disto é um favor que lhe faço, acredite. Agradeça-me depois.
Como era de esperar, Christoper Lambert também não regressa, entregando Raiden a James Remar, que o transforma num canastrão de primeira… Ainda para mais porque lá para o fim há de trocar os longos cabelos sedosos e o traje de Iemenjá por um corte de cabelo e uma camisa estilosa aberta até ao umbigo. E depois reaparece Scorpion, Sub-Zero, Jaxx (agora com braços metálicos), mais Smoke, Sindel, Sheeva, Motaro (o American Gladiator Deron McBee… viram Muscles & Mayhem?)… Uff, são mais que as mais. De tal forma que não há tempo para todos, se bem que o realizador John R. Leonetti insiste que todos tenham pelo menos 5 segundos de ecrã. Isso faz com que a maioria apareça para desaparecer logo a seguir. Sheeva leva com um pau na cabeça e desaparece, Sub-Zero faz um discurso longo para não mais voltar e por aí fora.
Há ainda uma estranha luta na lama entre Sonya Blade e Milena, tão gratuita quanto fora do contexto, que só serve para criar ainda mais vergonha alheia. Como se não fossem suficientes os maus diálogos, os saltos encarpados sempre que alguém precisa de descer uns degraus (porquê, a sério?) ou os efeitos-especiais, especiais como em “necessidades especiais”. Há pouca coisa a recomendar em Combate Mortal 2 – Aniquilação que justifique a Hamburga de Choco.
Título: Mortal Kombat 2 – Annihilation
Realizador: John R. Leonetti
Ano: 1997