| CRÍTICAS | Hackers – Piratas Cibernéticos

Em meados dos anos 90, a democratização da internet era plena e um admirável mundo novo que abria portas. De repente, as possibilidades eram imensas e o céu parecia ser o limite. Rapidamente, Hollywood apaixonou-se pela net e pelos seus desafios: os hackers, com todos os seus vírus, worms e outras ferramentas digitais, que podiam colocar em jogo o equilíbrio mundial apenas com um PC e um modem. Nascia assim o hackexploitation, um género tão breve quanto o tempo que se demorou a perceber que a internet e os computadores não funcionavam bem assim e que hoje em dia é terrivelmente datado.

Hackers – Piratas Cibernéticos, o filme que lançou Angelina Jolie e o seu soon to be marido e ainda mais soon to be ex-marido Jonny Lee Miller, é provavelmente o grande título deste sub-género. É um primo próximo do A Rede, com quem partilha algumas temáticas, e uma versão do Jogos de Guerra para a década de 90. Mas é sobretudo o que melhor capta o espírito dos nineties.

O realizador Iain Softley procura captar um ambiente e um estilo futurista, antecipando o ciberespaço como este parecia que se iria tornar, desde que William Gibson lançou esse livro fundador do género, que é o Neuromancer. É um universo de má moda, luzes néon, óculos escuros estilizados (porque os hackers usavam óculos escuros quando estavam ao computador?), graviteis do estilo bombar e, especialmente, muita música electrónica manhosa. Em termos de banda-sonora, Hackers – Piratas Cibernéticos é um irmão de Combate Mortal, o filme que melhor consolidou esse tipo d música e que parecem sempre os lados b de um mau disco dos Prodigy.

Mas não só. Softley procura retratar estes miúdos, que apesar de andarem no liceu e ainda viverem com os pais, têm o mundo aos seus pés à distância de um teclado de computador, como autênticos badasses e, consequentemente, criadores de tendências. Por isso, todos eles têm nicknames pomposos, uma atitude blasé perante os seus semelhantes que não têm PC e, sempre que não estão ocupados a ter diálogos super-descritivos para percebermos o que estamos a vê-los quando estão a digita furiosamente, dizem one liners espirituosas que não significam absolutamente nada.

Além disso, Iain Softley enche o filme de planos rápidos, uma edição epiléptica e efeitos de transição manhosos como um teledisco dos anos 90. Na mesma década, uma série de realizadores desta escola haveriam de tomar conta de Hollywood, mas Softley é tão kitsch que nunca passou da cepa torta. Hackers – Piratas Cibernéticos tem mesmo uma montage que é provavelmente a mais ridícula de todas as montages da história do cinema, algures entre aquele anúncio anti-pirataria que abria os DVD (e os cinemas durante algum tempo) e este meme.

E, no meio disto tudo, nem sequer falei da história do filme. Hackers – Piratas Cibernéticos é a tentativa dum engenheiro informático malvado de uma multinacional em criar um software que desvie milhões de dólares para a sua conta, ao mesmo tempo que lança um anti-vírus que afunda petroleiros para criar uma cortina de fumo e culpar os jovens hackers que a policia persegue. Estes, para se defenderem e revelarem o seu plano pérfido, terão de se unir e de trabalhar em equipa, enquanto que Lee Miller e Jolie desenvolver uma relação de “quanto mais me bates mais eu gosto de ti”. Anda lá também um jovem Renoly Santiago, que depois veríamos em Mentes Perigosas, e um hiperbólico Matthew Lillard, o Shaggy de Scooby-Doo. Hoje em dia é difícil perceber como é que um Happy Meal destes foi feito, mas em 1995 Hackers – Piratas Cibernéticos era o futuro sobre a forma de filme e a melhor coisa jamais criada pelo homem desde o pão fatiado.

Título: Hackers
Realizador: Iain Softley
Ano: 1995

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