Eis o filme de que toda a gente fala. Não por qualquer mérito cinematográfico na adaptação de um fenómeno da literatura de supermercado, que vendeu 30 milhões de cópias, mas por causa da polémica que envolve a protagonista, Blake Lively, e o realizador e co-protagonista Justin Baldoni. O caso veio mesmo a calhar para os tablóides e para a internet, que já estava a ressacar por algo semelhante desde que terminou o julgamento de Johnny Depp e Amber Heard. Ainda por cima, é uma polémica que dá para usar o hashtag #metoo, o que dá sempre outro engajamento nas redes sociais.
Para quem tem andado arredado das redes sociais e não sabe do que estou a falar, Blake Lively apresentou queixa contra Baldoni por assédio sexual e denunciou uma campanha de difamação contra si. O que não deixa de ser curioso, tendo em conta que estamos a falar de um filme sobre abuso e violência doméstica. Imaginem agora que tudo não passava de um golpe de marketing, para dar um boost a um filme que não tem sido recebido como propriamente os produtores esperavam. Tirava-lhe já o chapéu.
Até isso acontecer, limitem-nos ao que se passa na tela. Para quem nunca ouviu falar de Isto Acaba Aqui, livro-sensação que se tornou num fenómeno das redes sociais especialmente graças ao TikTok e aos bookstagrammers, é a história de Lily Bloom (Blake Lively), uma jovem que conhece o homem dos seus sonhos. Ele é Ryle Kincaid (Justin Baldoni), solteiro, neurocirurgião e com uns abdominais definidos a martelo e cinzel, um tipo tão perfeito que só podia ser mentira. Plot twist: era mentira. Ryle Kincaid é um tipo abusivo, que perde facilmente o controle e que gosta de assentar sopapo em quem quer que seja.
O tema é pertinente e a mensagem importante. Mostra como o padrão de violência doméstica se prolonga nas nossas vidas, caso não façamos nada para interromper o ciclo. É isso que termina precisamente aqui, de acordo com o título (se bem que o original é mais isto acaba connosco), já que Lily Bloom tem dificuldade em reconhecer na sua própria vida os mesmos comportamentos que censurava ao pai (por ser violento) e à mãe (por não se libertar das grilhetas do abusador). Mas está Isto Acaba Aqui à altura da sua mensagem?
A resposta é… é complicado. E duvidoso. É que Justin Baldoni transforma tudo isto num filme romântico muito bonitinho, onde tudo é super-fofo e cor-de-rosa. É tudo tão perfeito que qualquer cena de Isto Acaba Aqui podia servir de ilustração para um daqueles livros de lifestyle dedicado ao hygge, essa palavra dinamarquesa tão em voga que serve para definir uma certa ideia de aconchego da alma. Aliás, a violência doméstica até surge quase como um empecilho, já perto do final, um aborrecimento que mais vale varrer para o lado para permitir o final feliz daquele casal lindo, perfeito e adorável. Isto Acaba Aqui é o Comer Orar Amar da violência doméstica.
Durante Isto Acaba Aqui, Blake Lively ignora várias red flags de Justin Baldoni. No entanto, nenhuma é tão flagrante quanto aquela em que ele diz qual a música que quer escolher para o seu funeral: With Arms Wide Open, dos Creed. Aí nesse momento fiz logo uma nota mental que o filme não poderia receber nada mais alto do que um Happy Meal.
Título: It Ends With Us
Realizador: Justin Baldoni
Ano: 2024