Souleymane, interpretado pelo (não)actor Abou Sangare e cuja experiência pessoal influenciou a do filme, é natural da Guiné-Conacri e, antes de chegar a França, passou pela Algéria, a Líbia e a Itália. Foi em busca de uma vida melhor, para a si e para a mãe que ficou em casa. Na Guiné-Conacri ficou também a namorada, com quem vai comunicando por via chamada, mas cuja vida parece que está a afastar cada vez mais, em vez de criar as condições desejadas para os aproximar e permitir uma vida conjunta digna.
Souleymane tem um daqueles trabalhos que não só é precário, como normalmente é racializado. Souleymane faz entregas numa bicicleta, por conta de um aplicativo no seu telemóvel, mas como é emigrante ilegal, tem que trabalhar com a conta de outrem, que aluga a um terceiro. Ao mesmo tempo, um tipo da associação local dos emigrantes guineenses vai cobrando-lhe para lhe arranjar documentos e papeis que corroborem a sua história falsa, mas que pode ajudar a convencer os senhores da AIMA lá do sítio a dar-lhe asilo.
Souleymane tem assim uma existência de inviabilidade a vários níveis: emigrante ilegal, trabalha com a conta de outra pessoa e procura receber asilo político com uma historia inventada. E, como o título indica, A História de Souleymane conta a sua jornada pelo direito a existir, a ter um trabalho e a ter um tecto ou comida no prato.
No entanto, A História de Souleymane não é propriamente um filme-denúncia. Ou, pelo menos, da mesma forma que o entendemos do cinema de Ken Loach, por exemplo. A herança de A História de Souleymane é antes algo como A Herança ou mesmo Diamante Bruto: filmes urgentes e nervosos, sobre homens que precisam de ultrapassar os problemas que vão surgindo no seu caminho da melhor e mais rápida forma possível.
O realizador Boris Lojkine filma A História de Souleymane com proximidade, sempre à base de grandes planos e, muitas vezes, de bicicleta a pedalar pelas ruas de Paris, levando-nos também naquela viagem quase imersiva. Por isso, quando na última cena, Souleymane se senta finalmente durante um momento, para a entrevista com a inspectora da AIMA para ouvir a sua história e decidir se o asilo é procedente ou não, é como se todas as frustrações da última hora e meia de filme se descarregassem agora. É uma cena de redenção incrível, que valeu a Abou Sangare o prémio de melhor actor em Cannes. E um Le Big Mac aqui, neste imodesto tasco.
Título: L’Histoire de Souleymane
Realizador: Boris Lojkine
Ano: 2024