Já todos passámos por isto ou, se ainda não, iremos passar mais cedo ou mais tarde: um dia damos por nós e já não somos apessoa que eramos. Para o bem e para o mal, crescemos e mudamos, os nossos objectivos de vida alteram-se eaté as relações com os nossos amigos de infância estão diferentes.
Ofilme que melhor reflectiu sobre isso foi Os Amigos de Alex, mas para efeitos da presente prosa o exemplo que mais convém é o de The World’s End. Ou seja, o do grupo de amigos que, dando por si enleados nas obrigações da vida adulta, decidem planear algo juntos e reviver as glórias de um passado não muito longínquo.
Os quatro amigos de The Ritual decidem ir fazer uma caminhada pelo Trilho do Rei, algures entre a Suécia e a Noruega. E por duas razões: a primeira porque não chegaram a consenso quanto a destinos mais tradicionais, como Ibiza ou Amesterdão; e a segunda porque era o desejo de Rob (Paul Reid), o quinto amigo que morreu inesperadamente durante um assalto a uma loja na noite em que decidiam esta viagem.
Os quatro amigos levam assim uma bagagem adicional para a viagem. Luke (Rafe Spall) leva a culpa por não ter feito tudo ao seu alcance para salvar o amigo dos malfeitores; e os restantes levam a sensação reprimida de que a culpa da morte do amigo é mesmo de Luke. E como éque isso vai influenciar o desenvolvimento do filme? Muitas vezes de forma descontextualizada e outras um tanto atabalhoada. E, na maioria das vezes, de nenhuma forma em absoluto.
Durante a caminhada, os amigos vão tomar um atalho por uma floresta assustadora e acabam emaranhados em bruxaria nórdica. The Ritual é uma espécie de O Projecto Blair Witch, mas sem found footage. No entanto, apesar de criaturas grotescas (mais sugeridas do que gráficas) e até cultistas saloios, em última instância é um filme sobre o carpir da dor, o expiar da culpa e do luto. Até porque a tal criatura – que tem muito a ver com mitologia nórdica, apesar de pouca (nenhuma?) explicação – manifesta-se consoante o pesar e o arrependimento das vítimas.
David Bruckner, que deu nas vistas com V/H/S durante o revival do found footage, é excelente a criar ambiente, claramente influenciado por outros filmes ritualistas, subgénero muito em voga nos anos 70 após O Exorcista. Infelizmente, o argumento que tem em mãos parece ter-lhe chegado incompleto ou cheio de opções duvidosas. Por exemplo, quando tudo começa após uma noite passada numa cabana almadiçoada, todos acordam de epsadelos terríveis de forma estranha: um todo nu a rezar no andar de cima, outro todo mijado, outro na rua com quatro buracos no peito e o quarto está a chorar de horror. E o que fazem? Arrumam a trouxa porque está na hora de zarpar, continuando a caminhar pela floresta como os sete anões, como se nada se passasse. The Ritual é um Double Cheesebuger com um visual muito bom, mas muitas ideias deixadas (literalmente) a meio.
Título: The Ritual
Realizador: David Bruckner
Ano: 2017