| CRÍTICAS | Hesher Esteve Aqui

Houve uma altura em que Joseph Gordon-Levitt era apenas o puto de Terceiro Calhau a Contar do Sol. Depois, sem que nada o fizesse antever, Gordon-Levitt fez dois filmes incríveis que nos deixaram a pensar (alguém mencionou Brick e Mysterious Skin?). Queres ver que afinal o miúdo ainda se faz? E não é que se fez mesmo! Em menos de nada, Gordon-Levitt estava em todo o lado, entre blockbusters desmiolados (o franchise GI Joe), filmes de prestígio (A Origem) ou comédias românticas (500 Dias com Summer). E agora já há um tempo que não o vemos outra vez.

Hesher Esteve Aqui foi uma espécie de filme que fez a transição entre o cinema independente com o filme de estúdio, quase como um filme de passagem de Joseph Gordon-Levitt para o mainstream. Até porque Hesher Esteve Aqui é um filme difícil de catalogar, assim como as suas próprias personagens. Tanto Gordon-Levitt, como Devin Brochu ou Natalie Portman, os três protagonistas que foram o triângulo principal de Hesher Esteve Aqui, são personagens que não parecem sequer pertencer ao mesmo filme.

Entramos em Hesher Esteve Aqui como se entrássemos num comboio em andamento, que já tivesse partido há algum tempo da estação e que, por isso, não sabemos de onde vem ou para onde vai. E o realizador Spencer Susser nunca tem pressa de nos revelar esses pormenores. A história vai-se desenrolando lentamente, acabando por ser cumprir por completo já na entrada do acto final. Por isso, quando entramos em Hesher Esteve Aqui, damos de caras com uma família desfeita: Devin Brochu vive com o pai (Rainn Wilson) e a avó (Piper Laurie), numa casa em que a ausência da mãe é um elefante na sala impossível de não ver (vão haver mais, by the way). O pai é um farrapo que passa os dias no sofá, alimentado a comprimidos; e a avó faz o que pode para colar os cacos.

Na escola, as coisas não melhoram para Devin, que tem um bully sempre à perna. Mas um dia cruza-se com um estranho metaleiro (Joseph Gordon-Levitt), com uma pancada pelos Metallica e uma obsessão em andar em tronco nu (ou só em cuecas). Gordon-Levitt aparece um dia lá em casa e muda-se, sem pedir sequer permissão. A coisa é tão absurda que só a podemos aceitar como credível. E, de repente, começamos a ver onde é que aquilo tudo vai dar. Devin e Gordon-Levitt vão-se tornar amigos inesperados, certo? Errado!

É que Gordon-Levitt tem um estranho fascínio pelo abismo e isso leva-o sempre para a auto-destruição. Estão a ver a teenage angst toda acumulada de Fúria de Viver? Agora multipliquem-na por mil! Quando pensamos que ele vai resolver a situação, acaba sempre por tomar a decisão pior. Quando vê Devin a ser humilhado pelo bully de estimação decide não intervir; quando tenta ajuda-lo a vingar-se leva o acto longe de mais; e quando conhece Natalie Portman… bem, mas o que faz Natalie Portman aqui? No fundo, é só mais um pauzinho que Spencer Susser se diverte a pôr e a tirar na engrenagem para a sabotar sempre que parece estar a encarrilar.

Hesher Esteve Aqui é um coming of age anarquista, que segue os mesmos princípios de que a teoria da dor: a de pressionar os pontos que doem aos limites do suportável, até que a dor se transforme ela própria numa não-dor. É, por isso, um feelgood movie que lida com muita destruição gratuita, linguagem obscena e umas metáforas pornográficas, como se Confúcio fosse um realizador porno. Spencer Susser tinha em mãos matéria perigosa e altamente inflamável e, quando termina o filme com profanação de cadáver enquanto matéria de redenção pessoal, percebemos que a coisa não funcionou propriamente bem. Mesmo para quem tenha os limites do humor negro bem abertos. Mas Hesher Esteve Aqui não deixa de ser, por isso, uma proposta diferente da que estamos habituados, como um Double Cheeseburger com uma rodela de ananás em vez da hamburguesa. Não faz sentido, mas quem é que não quererá experimentar?

Título: Hesher
Realizador: Spencer Susser
Ano: 2010

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