Depois daquele fenómeno que foi o director’s cut do seu League of Justice, com direito a distribuição comercial por pressão dos fãs, Zack Snyder surge de peito inchado com o seu novo Exército dos Mortos, uma produção Netflix. A plataforma de streaming costuma dar carta branca aos seus autores, mas mesmo que não desse, quem é que teria coragem para dizer o que quer que fosse a Snyder?
Por isso, não é de admirar que, apesar de ser um filme de zombies, Exército dos Mortos tenha duas horas e meia e só a introdução tenha uns vinte minutos. Depois de um prólogo que explica a origem do filme – uma criatura meio-zombies meio-super-herói escapa de umas instalações governamentais e transforma Las Vegas numa zombie town, que o governo isola e pretende dizimar com uma bomba atómica -, Snyder lançar uma montage musical ao som do Richard Cheese, que é tudo ao mesmo tempo: genérico do filme, introdução às várias personagens do filme, prólogo à história, devaneio gore e desmiolado e muito colorido neon, ou não fosse este um filme de zombies em plena Las Vegas, o recreio da América. Na ânsia de querer ser tudo, esta abertura de Exército dos Mortos não é nada. Snyder tinha tentado algo semelhante em Watchmen – Os Guardiões, mas aí a coisa funcionou ao som do Bob Dylan. Aqui não.
Nos últimos anos têm sido várias as tentativas de redefinir o género do filme de zombies. Desde então os mortos-vivos começaram a correr, quebrando uma das regras básicas do género. Se a tendência é para continuar a insistir nesta patetice, então o melhor é pararem já. Não queremos nada disto! Os zombies de Exército dos Mortos não só correm, como pensam, comunicam, falam, namoram… têm cavalos zombie(!), tigres zombie(!!) e usam capa e elmos medievais(!!!). Ok, reconheço que um tigre zombies até é fixe. Mas o resto não tem nada de mortos-vivos. E até podem alegar que este é um filme de super-heróis e não de mortos-vivos, mas Zack Snyder referencia directamente George Romero no título. Por isso, esta discussão acaba aqui.
Quanto à história em si, é um filme de homens em missão, em que Dave Bautista é uma ex-mercenário que lidera uma equipa eclética de gente mais ao menos aleatória (que inclui um youtuber(!) e tudo), cuja única coisa que têm em comum é a falta de carisma e jeito para representar, para entrarem em Las Vegas e roubarem o dinheiro do cofre de um dos casinos antes que a bomba atómica expluda (olá Nova York 1997, como estás?). Pelo caminho ficam algumas ideias giras, mas que nem são sequer exploradas, o que faz querer que foram apenas involuntárias: o facto de ser Las Vegas a cidade sitiada, a Sodomia e Gomorra modernas, a cidade do pecado… e o campo de refugiados em quarentena que nasce dali, onde quem tem febre é um alvo a abater (estão a ver onde é que isto poderia ir parar neste cenário actual de emergência higiénico-sanitária?).
Zack Snyder acha que isto ainda não é suficiente e continua a inserir personagens neste ensemble, incluindo a filha de Bautista (Kate Ward), que num dos sub-plots mais ridículos do filme (e existem vários, acreditem), irá acompanhar os amigos do pai à procura duma mãe refugiada, que foi feita prisioneira pelos zombies(!). Depois explode tudo em gore à Peter Jackson dos tempos de Morte Cerebral, porque Exército dos Mortos não é para se levar a sério. Quer dizer, é. Mas apenas quando está a matar zombies. Estão a perceber? Nós também não.
Este é o segundo filme de Zack Snyder com argumento original do próprio e, depois de Sucker Punch – Mundo Surreal, a conclusão é óbvia e não precisamos de mais exemplos: por favor, não escrevas mais nada. Exército dos Mortos é um monstro de Frankenstein que faz pouco sentido, como se o monstro não tivesse ressuscitado em condições e agora fosse apenas um cadáver a estrebuchar. Por favor, alguém que acabe com o seu sofrimento. E a Hamburga de Choco só não é pior porque tigre zombie, lembram-se?
Título: Army of the Dead
Realizador: Zack Snyder
Ano: 2021