Os jovens de hoje em dia já nada têm a ver com os de há 20 anos atrás, mas as comédias de adolescentes de hoje em dia continuam a ter como molde o American Pie – A Primeira Vez, focando-se sobretudo nas piadas sexuais e escatológicas. E depois ninguém entende porque os teen movies já não têm sucesso (nem graça). Afinal de contas, as gerações actuais estão muito mais conscientes de problemas que foram varridos para debaixo do tapete durante décadas (desde a falta de representatividade das minorias às questões de género, passando pelo tabu que é (era?) a saúde mental. Por isso, quando alguém reivindica maior visibilidade para estas questões lá vêm os mimimis defender que dantes era bom, quando reprimíamos traumas lá bem no fundo e vivíamos a ignorar os problemas. Aliás, basta ver como o American Pie – A Primeira Vez envelheceu mal. Não era tão fixe gozar com com a devassa da privacidade das raparigas, por exemplo? Então se elas forem estrangeiras ainda melhor. Só que não.
E eis-nos então chegados a Booksmart – Inteligentes e Rebeldes, um teen movie para a geração woke (e não, woke não é aqui um insulto). É uma comédia adolescente que também fala de sexo, de testosterona aos saltos e de festas de fim de escola, mas sem ser propriamente inconveniente. E ainda inclui questões de género e sexualidade de forma natural, dando viabilidade e representatividade a pessoas normalmente inviabilizadas, de forma integrada no texto, sem soar a gesto forçado para cumprir uma agenda qualquer. É um filme com consciência e, logo aí, sai a ganhar. Primeiro, pela surpresa do gesto. E, segundo, porque, surpresa!, tem graça.
Estamos então num qualquer liceu dos Estados Unidos, com todas as suas tribos urbanas, no final do ano lectivo. As protagonistas de Booksmart – Inteligentes e Rebeldes são as duas betinhas da escola, a irritante e controladora Molly (Beanie Feldstein) e a mais reservado Amy (Kaitlyn Dever). As duas são bff e passaram a escola toda a se esforçaram ao máximo para terminarem com uma média alta e entrarem numa universidade de elite. Dispensaram tudo o que era festa e diversão e estudaram, participaram em tudo o que era actividade extra-curricular e esforçaram-se além do expectável.
Por isso, quando no último dia de escola Molly percebe que os outros, os miúdos populares e burros, também entraram todos na universidade (ou já estão a fazer trabalho com os seus próprios projectos pessoais, por exemplo), a dúvida assalta-lhe o espírito: de que valeu então tanto sacrifício? Só uma solução se afigura possível: aproveitar a festa daquela noite para viver de uma só vez tudo aquilo que andou a perder durante 3 anos – ou seja, sexo, drogas e rock’n’roll, não necessariamente por esta ordem -, de forma a se redimir do tempo perdido. Molly convoca Amy e ei-las lançadas para a noite das suas vidas.
Booksmart – Inteligentes e Rebeldes é assim a versão feminina de Super Baldas, com Molly e Amy a saltarem de festa em festa (se bem que algumas de festa só têm mesmo o nome) durante uma noite, cruzando-se com figuras bizarras (destaque para Skyler Gisondo, que procura comprar a amizade das pessoas com o dinheiro que tem a mais) e situações… diferentes, que as vai levar, num arco perfeito, a uma redenção pessoal que não terá propriamente os resultados com que contavam (mas os efeitos serão os mesmos).
Booksmart – Inteligentes e Rebeldes consegue ter graça sem ser inconveniente, mostrando que, ao contrário do que muita gente pensa, continua a ser possível rir com piadas escatológicas em 2022. É certo que muitas vezes as personagens são demasiado irritantes (sim, isto é para ti, Beanie Feldstein) e fica a ideia de se esforçar demasiado, esticando a maioria das situações para lá do necessário, mas hei, há quanto tempo não víamos uma comédia adolescente que conseguíssemos terminar? Só isso já justifica o McChicken, não acham?
Título: Booksmart
Realizador: Olivia Wilde
Ano: 2019