Já poucos acreditavam num quinto Indiana Jones com Harrison Ford e outros tantos ficaram surpreendidos o actor a regressar ao papel já octogenário (para ser mais preciso, com 77 anos, já que o filme começou a ser rodado há 3 anos atrás). Mas não eu! Afinal de contas, Spielberg, Lucas e o próprio Ford haviam prometido cinco filmes quando estrearam o primeiro, Os Salteadores da Arca Perdida, em 1981. E quando a vocês não sei, mas a mim eles nunca mentiram.
Seja como for, a estreia de um Indiana Jones é sempre um acontecimento. Ainda para mais quando é o último com Harrison Ford. E, por muito que nos custe a admitir, já sabemos que não vai saber ao mesmo. E nem é tanto por o filme ser melhor ou pior, é porque os tempos são outros e até o próprio cinema é diferente. Já assim foi com o Reino das Caveiras de Cristal. Esse quarto episódio, estreado vinte anos após A Grande Cruzada, quando já ninguém acreditava que Spielberg e Lucas cumprissem a promessa, não era propriamente um mau filme – ou, pelo menos, não é pior (nem melhor) do que O Templo Perdido -, mas já não soube ao mesmo.
Ciente disso, o novo Marcador do Destino aposta forte no factor nostalgia e entra a todo o gás, com um prólogo cheio de acção. Não há tempo para respirar e a nostalgia bate-nos de frente na cara, com força. Há Harrison Ford rejuvenescido digitalmente, há nazis e até Mads Mikkelsen, o novo vilão de serviço, parece-se tanto com Ronald Lacey que ficamos à espera que a sua cara comece a derreter a qualquer momento. Mais tarde ainda haverá de aparecer John Rhys-Davies (e, que se lixem os spoilers, Karen Allen também) para que a trip pela memory lane seja total.
O prólogo de Marcador do Destino passa-se então em 1944, durante a retirada dos nazis, recriando ao período pós-Os Salteadores da Arca Perdida. E, para isso, foi preciso utilizar as novas tecnologias para por Harrison Ford novo outra vez. Quando as cenas de acção aceleram, o CGI ressente-se e, de repente, a viagem nostálgica torna-se antes numa espécie de viagem num comboio fantasma. Contudo, não deixa de ser uma questão interessante de se colocar num filme que é todo ele sobre a passagem do tempo, o passado e, sobretudo, o futuro.
O prólogo serve então para introduzir o Antikythera, uma relíquia inventada por Arquimedes na Grécia Antiga e que um físico nazi (Mikkelsen) acredita que permite controlar o tempo. Salta-se então para a actualidade, ou seja, para 1969 – o Homem acabou de regressar da sua curta caminhada na lua e na rádio ouve-se o Space Oddity, de David Bowie – e Harrison Ford está velho, a divorciar-se de Marion, o filho morreu no Vietname e está quase quase a reformar-se. Isso não o impede de embarcar numa última aventura, depois de reencontrar a afilhada (óptima Phoebe Waller-Bridge), mais o seu sidekick juvenil (Ethann Isidore a piscar o olho ao Short Round), para tentar encontrar a segunda parte da tal traquitana de Arquimedes antes dos maus.
O Marcador do Destino é sobretudo um filme de acção, montado na lógica do jogo do rato e do gato, que passa por Marrocos, Grécia (onde Antonuio Banderas é um desaproveitado secundário de luxo) e Sicília. E, por isso, não conseguimos deixar de pensar constantemente que aquele é um homem de 80 anos que está diante de nós, a socar nazis, a saltar de tuk-tuks em movimento ou a mergulhar nas profundezas do Mediterrâneo. Falta a O Marcador do Destino uma maior noção do seu próprio corpo, mas também é verdade que Indiana Jones nunca se distinguiu por pensar demasiado.
O certo é que a primeira metade do filme é eficiente, primeiro por cavalgar a onda da nostalgia de forma eficaz e, segundo, por introduzir Indiana Jones ao thriller político conspiratório dos anos 70, circa All The President’s Men. James Mangold, pela primeira vez a ocupar a cadeira de realizador deixada vaga por Steven Pielberg, parecia ser a pessoa certa para o lugar depois de andar a brincar com um legado muito norte-americano (do western ao biopic de Johnny Cash) e com heróis na reforma (olá Logan). No entanto, é sempre demasiado anónimo, um tarefeiro que se limita a montar as sequências de acção umas a seguir à outra e sem serem propriamente inspiradas.
O problema de O Marcador do Destino começa sobretudo a partir do meio, ali depois da entrada em cena de Banderas. O filme começa a tornar-se cada vez mais musculado e o argumento menos burilado, especialmente feito à base de coincidências e deuses ex-machina. Especialmente a personagem de Mads Mikkelsen, que nem se percebe muito bem como é que continua a conseguir acompanhar a perseguição aos nossos heróis. E depois há todo o final, com o seu paradoxo da predestinação, que vai fazer com que todos aqueles que detestaram os extraterrestres de Reino das Caveiras de Cristal espumarem ainda mais de ódio. Como alguém já disse, O Marcador do Destino não é um bom filme, mas também não há exactamente nada para não se gostar. Mas com um Double Cheeseburger, é claramente o menos conseguido dos cinco tomos da série.
Título: Indiana Jones and the Dial of Destiny
Realizador: James Mangold
Ano: 2023