| CRÍTICAS | Dead Mountaineer’s Hotel

Quando pensamos em ficção-científica soviética, pensamos automaticamente num nome: Andrei Tarkovski. Depois, dependendo do nosso conhecimento cinéfilo (ou nerdice sci-fi), somos ainda capazes de ir ao Aelita ou outro clássico dessa altura. E, no entanto, existe tanta coisa para descobrir.

Dead Mountaineer’s Hotel chega da insuspeita antiga república soviética da Estónia e é considerado por muitos como um dos três melhores filmes do país. O que também não deve ser difícil, tendo em conta que não conhecemos mais nenhum, com excepção do Tangerinas que passou pelas nomeações ao Oscar de melhor filme estrangeiro aqui há uns anos). No entanto, há outra curiosidade: Dead Mountaineer’s Hotel é baseado num romance dos mesmos autores que escreveram Stalker. E, em menos de dois parágrafos, lá regressámos ao início e ao Tarkovski, nome incontornável quando se discute ficção-científica soviética.

Mas Dead Mountaineer’s Hotel não é tanto um filme de ficção-científica, sendo antes uma espécie de film-noir tardio, narrado por Peter Glebsky (Uldis Pucitis), um taciturno inspector da polícia que é chamado a uma ocorrência num hotel isolado no topo de uma montanha. E além de ter o sugestivo nome de O hotel do alpinista morto, não existe um único hóspede ali que não seja um pouco… raro. Lembram-se do hotel em Tróia do distópico Aparelho Voador a Baixa Altitude? Comparado com estes, eram tudo pessoas normais.

Apesar da chamada anónima se ter revelado (aparentemente) falsa, Glebsky acaba por passar a noite no hotel. E depois de uma avalanche ter cortado todas as estradas de acesso e as comunicações telefónicas, um dos hóspedes aparece morto. De repente, o film noir dá lugar ao whodunnit, mas vai haver alienígenas, robots e até zombies metidos ao barulho.

Não existem propriamente twists no argumento nem revelações incríveis; o inspector Glebsky limita-se a ir interrogando hóspede a hóspede, até ir conseguindo encontrar uma incongruência nos testemunhos aqui e ali, que lhe permitem levantar um pouco do véu à intriga. No entanto, nunca nada é explicado ou revelado, ficando sempre nas entrelinhas e nas possibilidades. Tudo isso acaba por soar também a metáfora para com o regime soviético, que então estava a queimar os últimos cartuchos na Estónia, sublinhado a grosso pelo discurso final de Glebsky, que confessa à câmara que o seu único propósito é cumprir o seu dever sem colocar questões. Só não percebemos se essa intenção é voluntária ou não…

Por isso, o que interessa mesmo em Dead Mountaineer’s Hotel é atmosfera claustrofóbica, quase sufocante, fazendo lembrar o outro whodunnit em modo panela-de-pressão que é Bunker Hotel, que o realizador Grigori Kromanov acentua com a incrível banda-sonora cheia de sintetizadores, muito à frente do seu tempo, e com os inúmeros planos cheios de espelhos a abusar dos reflexos e duplas imagens (e duplos sentidos). Dead Mountaineer’s Hotel é um filme para se ver nas entrelinhas, até porque aquilo que tem para mostrar está terrivelmente datado. O Cheeseburger sabe a curiosidade, mas não mais que isso.

Título: ‘Hukkunud Alpinisti’ Hotell
Realizador: Grigori Kromanov
Ano: 1979

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *