Existem dois tipos de pessoas no mundo: as que gostam do Rambo e as que gostam do Rocky. É possível gostar de ambas as personagens que imortalizaram Sylvester Stallone nos anos 80, mas toda a gente preferirá sempre um ao outro. É como os Stones e os Beatles. Ou se prefere o pugilista que acabou com a Guerra Fria sozinho ao derrotar Ivan Drago ou se prefere o Boina Verde que derrotou os soviéticos no Afeganistão ao lado dos talibans. Gostar dos dois por igual é que é impossível.
No entanto, a primeira vez que ouvimos falar de John Rambo ele era ainda muito diferente do herói de direita, que fez as delícias de Ronald Reagan. Rambo era um soldado de elite, especialista em guerrilha e o último sobrevivente do seu esquadrão, que nos foi apresentado a deambular pelos Estados Unidos, sem trabalho e com problemas de readaptação. Por azar, vai parar a um vilarejo pertinentemente chamado Hope, que de tolerante tem muito pouco. E depois de ser pressionado pelo xerife local e os seus homens, Rambo perde as estribeiras e foge da prisão, mobilizando homens e meios num jogo do rato e do gato de grandes proporções.
Fugindo para o meio do mato, onde é o seu habitat natural, armado só com um facalhão – e que se tornou conhecido como “faca à Rambo”, tamanha é a dimensão iconoclasta do filme -, Rambo faz um poncho de serrapilheira e mete uma fita na cabeça, numa afirmação de estilo que se tornaria na sua imagem de marca nos próximos filmes. E, depois, Rambo: A Fúria do Herói é um dos melhores survivors movies de sempre. Primeiro porque o Rambo de Stallone dá o corpo ao manifesto, como um animal acorraçado mas extremamente perigoso; e, depois, porque Rambo: A Fúria do Herói é extremamemte realista, sem fogo-de-artíficio exagerado como qualquer blockbuster do género. Lembram-se de Fim-de-semana Alucinante? É ainda pior.
Depois, Rambo vira o bico ao prego e passa do mato para a cidade, transformando a presa em predador e vice-versa. Nessa altura, já entrou em cena o seu antigo Coronel (Richard Crenna), que vem tentar pôr algum bom-senso na cabeça do xerife e trazer Rambo de volta à razão. É ele também que faz a contextualização da personagem de John Rambo, transformando Rambo: A Fúria do Herói num dos melhores filmes sobre a desumanização da guerra e derramando alguma luz sobre os incompreendidos retornados do Vietname numa América pouco tolerante.
O sucesso de Rambo: A Fúria do Herói levou o filme a ter várias sequelas e a ser um fenómeno da cultura popular ocidental, mas é curioso ver que, o primeiro contacto com John Rambo, seja uma verdadeira antítese do que a personagem viria a tornar-se mais tarde. Belo McRoyal Deluxe, num filme muitas vezes subvalorizado na carreira de Sylvester Stallone.Título: First Blood
Realizador: Ted Kotcheff
Ano: 1982