Costumava ser fácil distinguir as boas das más séries. Em 10 segundos, topava-se-lhes logo a pinta. Depois veio a segunda temporada do True Detective e deixou de ser possível ignorar que é possível uma série ter um aspecto deslumbrante e um conteúdo merdoso (outro exemplo foi a insuportável Vinyl). Taboo não é propriamente uma série merdosa, mas já lá vamos. Comecemos pelos aspectos positivos.
Visualmente, Taboo é das séries mais assombrosas que já vi. A sujidade da cidade de Londres em inícios do século XIX é ela própria uma espécie de personagem da série e está de tal forma bem representada que, a seguir a um episódio, uma pessoa sente-se tentada a ir tomar um duche. Já se sabia que o ambiente do Sul dos EUA se dava bem quando misturado com magias negras, rituais africanos macabros, suor e pântanos. Esta série da BBC tenta fazer essa mistura não com o Sul dos EUA, mas com esta Londres e sai-se mais do que bem.
O problema está no resto. A série conta-nos a história de James Delaney (Tom Hardy), uma figura sinistra que volta a Londres doze anos depois de ter partido, após ter sido dado como morto e depois de ter vivido sabe-se lá o quê por terras de África, para reclamar a herança do pai que acaba de morrer. Delaney começa então a recrutar aliados e a matar tudo o que lhe aparece à frente para lhe dificultar o caminho. A história lembra O Conde de Monte Cristo, mas onde na obra de Dumas os motivos do protagonista são óbvios, aqui só sabemos que Delaney estava num barco que a Companhia das Índias mandou afundar matando centenas de escravos e que ele quer enriquecer pornograficamente obtendo o monopólio do negócio do chá da China.
Vamos lá ver, se o objectivo dele é o enriquecimento, a bota não bate com a perdigota. O que raio quero eu saber dos destinos de um selvagem que esventra e morde tudo o que mexe para conseguir os seus objectivos? Se o objectivo é uma espécie de vingança, então convinha que se dessem ao trabalho de explicar exactamente qual a origem desse desejo (ficamos com a impressão que James Delaney é uma espécie de Kevin Costner do Danças com Lobos) e convinha que ele não fosse tão sanguinário como as pessoas de quem se quer vingar.
E aqui está o maior problema de Taboo. A história é apresentada de forma tão atabalhoada que é difícil preocuparmo-nos com os destinos das personagens. Aliás, a relação incestuosa entre Delaney e a meia-irmã dá nome à série mas não passa de uma nota de rodapé na história. Todas as personagens aqui são misteriosas porque não se deram ao trabalho de lhes dar qualquer tipo de densidade. Ao invés, apostam em diálogos ininteligíveis, sotaques “místicos”, vozes sussurradas e flashbacks irritante e propositadamente vagos. Ao invés de profundidade na história, apostam em dar às personagens maneirismos que dão a entender que ainda há ali muita história para saber (mas que nunca é contada): Delaney não muda uma única vez de expressão durante a série, a sua irmã está sempre de olhos esbugalhados muito assustada, o vilão passa a vida a bater com a bengala em mesas…
Não é que esta seja uma série má, Taboo entretém-nos enquanto o protagonista vai conseguindo arranjar estratagemas para se escapar dos becos aparentemente sem saída (uma espécie de House of Cards mas no século XIX e um bocadinho mais sujo). Mas é uma série que tem uma boa ideia e uma estética irrepreensível, mas desperdiça-os completamente ao não se dar ao trabalho de ter uma história.