O início de Il Cratere é uma pescadinha de rabo na boca. Sharon, a jovem protagonista do filme, ensaia uns passos de dança ao espelho, enquanto cita em voz alta a matéria da escola. O tema? O verismo e o realismo.
Esta aparente inconsequente pormenor não é tão inocente quanto isso. E não é apenas pelo facto de terem sido duas correntes literárias com grande influência em Itália, com o segundo a espraiar inclusive para o cinema. É que Il Cratere é um filme em que demoramos aperceber se o que estamos a ver é ficção ou documentário.
Acabamos por descobrir que é mesmo um docudrama, mas sem nunca sabermos se há ali algo de realmente verdadeiro. Talvez seja apenas um filme que utiliza a linguagem visual e narrativa do documentário naturalista e não um documentário contaminado pela ficção.
Quanto ao filme em si, é a história da pequena Sharon, filha de feirantes do sul de Itália (Nápoles, sempre Nápoles, essa terra de forte personalidade), que decidem investir numa carreira musical da filha. Para isso, o pai desenvolve uma obsessão cada vez mais sufocante sobre a filha, que rapidamente deixa de aguentar a pressão e tamanhas expectativas.
Este ano já tínhamos visto Over the Limit, um documentário sobre a pressão esmagadora colocada sobre os ombros duma jovem atleta de alta competição. Tal como nesse filme, saímos de Il Cratere enervados com aquele homem, que insiste em viver mil e um sonhos através da filha. E, ao contrário de Over the Limit, Il Cratere pode ser um exercício de ficção, mas a forma como é filmado pelos realizadores, Luca Bellino e Silvia Luzi (malta que, curiosamente ou não, se fez no documentário), em constantes grandes planos sob os actores, tornam-no ainda mais sufocante. E aquela música pimba que ouvimos Sharon cantar até aos limites da exaustão, não nos tira o apetite por um Double Cheeseburger.
Título: Il Cratere
Realziador: Luca Bellino & Silvia Luzi
Ano: 2017