Era suicídio comercial ter uma das mais requisitadas actrizes da actualidade em carteira e não aproveitar para a capitalizar num filme em nome próprio. Por isso, a DC Comics aproveitou o hiato entre o Esquadrão Suicida e a sua sequela para lançar o filme a solo de Harley Quinn e aproveitar Margot *suspiro* Robbie.
Birds of Prey é, como o subtítulo indica, um filme de emancipação. Harley Quinn liberta-se finalmente do jugo do Joker, o seu namorado de sempre, e está livre para se tornar numa mulher forte, livre e independente. Isso também significa que vai ter no seu encalce todos aqueles que maltratou no passado para acertar contas, agora que não tem a protecção do Joker. Por isso, nada melhor do que juntar uma equipa de mulheres – a polícia Rosie Perez, a cantora Jurnee Smollett-Bell, a assassina Mary Elizabeth Winstead e a carteirista Ella Jay Basco – para uma demonstração de força e feminismo, fazendo deste um filme de heróis para o tempo do #metoo e enfurecendo uma série de saloios, que gritam coisas como marxismo cultural e esgrimem argumentos do género só fazem isto para ganhar dinheiro. Porque todos os outros filmes da história do cinema foram feitos com fins altruístas e para perder dinheiro, duh.
Harley Quinn é uma espécie de versão feminina do Joker. Por isso, enquanto vemos esse a tornar-se cada vez mais niilista nos filmes que a DC vai fazendo, Birds of Prey recupera o tom anarco-galhofa do Joker do Batman de Tim Burton. No entanto, esta é uma anarquia mais próxima dos Looney Tunes do que do terrorismo do Joker do Jack Nicholson. E, como bom blockbuster que é, o caos acabará mesmo por se transformar em decorativismo, mas felizmente sem estragar em demasia.
O resultado acaba por ser um filme surpreendentemente entretido, com uma estrutura narrativa pouco convencional, uma protagonista-narradora que fala directamente com o espectador e muitas sequências de luta perfeitamente legíveis. Ao vilão (Ewan McGregor) falta-lhe um bocadinho mais de presença e crueldade, mas nada que prejudique o resultado final. Afinal, este é um filme de heróis e não de vilões.
Para esta empreitada de girl power foi chamada Cathy Yan, a primeira asiática a fazer um filme de super-heróis em Hollywood, depois de ter sido, no ano passado, a autora do segundo filme oriental mais importante dos Estados Unidos, logo a seguir a Parasitas. Nunca se sente que Cathy Yan seja um peixe fora de água e consegue imprimir um pouco da sua própria marca, já que Birds of Prey é um filme altamente estilizado. Em contrapartida, vê-se claramente que este é um filme de mulheres feito por mulheres. Basta olhar para esta Harley Quinn e compara-la com a de Esquadrão Suicida, em que não há qualquer objectificção, incluindo no guarda-roupa. Talvez seja isso que irrite os saloios. Por mim, divirto-me bastante com o McChicken.
Título: Birds of Prey – And the Fantabulous Emancipation of One Harley Quinn
Realizador: Cathy Yan
Ano: 2020