Chloe (Kiera Allen) nasceu com tantos problemas de saúde, que, quando Corre! começa, elenca exaustivamente todas as suas doenças num intratítulo bem completo: asma, arritmia, diabetes e paralisia das pernas. Apesar de tudo, Chloe está a um passo de se autonomizar. Depois de 17 anos a viver dependente da mãe (Sarah Paulson), que inclusive orientou a sua escola em casa, Chloe está a um passo de entrar na universidade e sair de casa. Só precisa de ser aceite numa. Mas as cartas com as respostas teimam em não chegar…
Corre! começa assim de forma muito pausada, à medida que nos vamos ambientando à rotina de Chloe. Levanta-se de manhã, vai para a cadeira de rodas, põe cremes, toma uma bateria de comprimidos e depois vai agarrar-se aos livros, até porque não tem smartphone, enquanto espera ela chegada do carteiro. Os dias sucedem-se iguais uns aos outros até a um em que, por acaso, encontra uns estranhos comprimidos verdes aviados pela própria mãe.
É esse o evento que vai despoletar toda a intriga de Corre! e transforma-lo num thriller perigoso e claustrofóbico. Afinal de contas, Chloe é uma prisioneira duplamente confinada: está numa casa de onde não consegue sair, absolutamente isolada do mundo; e está presa a uma cadeira de rodas, que lhe limita os movimentos. Também há mais uma série de doenças incapacitantes, mas rapidamente o realizador Aneesh Chaganty as coloca de lado, caso contrário Chloe não iria conseguir nunca arrastar-se por telhados, partir vidros e saltar de escadas.
Existem semelhanças entre Corre! e Misery – O Capítulo Final, se bem que aqui estamos a falar de uma mãe paranóica. E toda a gente sabe que não há nada mais assustador do que uma mãe louca, foi Alfred Hitchcock quem nos disse pela primeira vez, nesse pioneiro do cinema de terror, Psico. Chloe vai-se armar em MacGyver, arranjar formas de superar as suas limitações (porque, como empreendedorismo nos ensinou, quem realmente quer muito tudo alcança) e procurar escapar às garras da mãe até ao clímax final e um twist absolutamente dispensável.
Corre! parte de uma interessante premissa, mas depois tem dificuldade em ultrapassar as suas próprias limitações. É um bom filme no trabalho dos dispositivos de género, especialmente na forma como vai manejando o suspense e o mistério, mas depois tem que jogar demasiado com a suspensão da descrença e cruzar os dedos na esperança que ninguém note em um ou outro plot hole. Não é um Cheeseburguer mau e, para todos aqueles que acharem que a história é demasiado espatafúrdia, vejam a seguir o documentário Mommy Dead And Dearest. Afinal de contas, a realidade ultrapassa sempre a ficção.
Título: Run
Realizador: Aneesh Chaganty
Ano: 2020