Toda a gente sabe que as casas assombradas são sempre mansões de várias assoalhadas ou palácios senhoriais. Nenhuma fantasma quer assombrar um T1 na Amadora ou uma loja convertida em alojamento local numa cidade gentrificada. Por isso, quando vemos Ellie (Emma Draper) a chegar à antiga casa de família, que mais parece a residência oficial de alguma família real europeia, percebemos logo que a coisa vai dar para o torto.
Ellie regressa assim a casa, antes de a vender, para dar uma vista de olhos geral e para aproveitar o tempo sozinha para terminar um livro sobre a magia negra no tempo medieval e de como esse deu origem ao pensamento analítico. Está grávida e traz também um olho à Belenenses, o que nos mostra que há esqueletos na bagagem. Mais tarde haveremos de perceber que traz também outras nódoas negras, não as sentimentais que cantava Jorge Palma, mas as existenciais. O que Ellie não estava à espera é que os pais também lá estivessem. E, pela forma como choca com a mãe (Julia Ormond), também percebemos que há ali qualquer coisa mal resolvida.
Reunion não nos dá logo as informações todas e essa economia narrativa prende-nos ao ecrã durante grande parte do filme. À medida que o realizador Jake Mahaffy vai cozinhando aquilo tudo em lume brando, começamos a ter flashbacks de um passado traumatizante de Ellie com uma irmã adoptiva. A matéria de estudo do seu livro também ajudam a criar uma atmosfera mais ou menos opressiva, que não precisa sequer de jump scenes para fazer sala. E depois, claro, há a casa, que é ela própria uma personagem no filme, com os seus recantos e jogos de luz e sombra.
Um problema recorrente deste tipo de filmes, em que os traumas do passado regressam para assaltar o presente dos personagens, é que muitas vezes podem-se tornar frustrantes com duplas interpretações ou significados pouco claros. Nada disto acontece em Reunion, que é relativamente bem linear. Houve um assunto mal resolvido na infância de Ellie e é preciso completa-lo para que todos os envolvidos, mortos ou vivos, possam descansar como deve de ser.
O problema vem depois, quando tudo isto se esgota, e Jake Mahaffy se apercebe que, se calhar, tem que fazer qualquer coisa para não se tornar tudo irrelevante. De repente, há um twist com um pai-cientista-louco que ninguém viu a vir, um contra-twist com uma mãe abusadora e disparam flashes e flashbacks que misturam as realidades temporais, sem que tenham realmente algum desenlace. E com toda essa salgalhada damos por nós a perguntar: se aquela é a casa onde Ellie cresceu com os pais e a irmã adoptiva, como é que no início ela vem para a vender depois da morte dos avós? Será que alguém se esqueceu de emendar essa parte no argumento e foi filmada por engano? Demasiadas questões e poucas perguntas para um Happy Meal frustrante.
Título: Reunion
Realizador: Jake Mahaffy
Ano: 2020