Michael Jordan, o mais jogador de basquetebol de todos os tempos (apenas equiparado por Carlos Lisboa, claro *piscar de olho a todos os benquistas*) já teve muitos herdeiros desde que pendurou as botas, mas nunca nenhum foi tão legítimo quanto LeBron James. O jogador dos Cleveland Cavaliers (e dos Miami Heat, e dos Lakers, e dos…) é o único que consegue rivalizar com His Arness em jogo jogado e em recordes e títulos conquistados, sendo mais que justo o cognome que entretanto lhe atribuíram: King James. Por isso, para se colocar, pelo menos, ao nível de Jordan, só lhe faltava um último desafio: uma sequela de Space Jam.
Ei-la finalmente ao vivo e a cores, depois de muitos avanços e arrecuas. E, de forma muito pertinente, recebeu o subtítulo muito apropriado de Uma Nova Era (em inglês faz mais sentido, um novo legado). Ou seja, Space Jam – Uma Nova Era não quer ser um substituto do Space Jam original, mas antes um filme distinto e até complementar.
Até porque Space Jam – Uma Nova Era não podia ser mais diferente, começando logo pela presença de LeBron James, que passa metade do filme em versão desenho-animado. Dizem as más línguas que essa foi uma forma de contornar a sua falta de jeito para representar (credo, as qualidades de actor de King James são inversamente proporcionais às suas habilidades para enfiar uma bola num cesto) e a verdade é que, se não foi, parece mesmo.
Tal como o primeiro Space Jam, também este começa com um prólogo em que vemos as origens de um jovem LeBron James, de origens modestas e a educar-se desde logo em dois pilares fundamentais: concentração e dedicação. Depois passamos para os tempos actuais e vemos como LeBron é um idiota para com os filhos, nomeadamente o mais novo, Dom (Cedric Joe), que quer à força que ele se torne basquetebolista, quando o miúdo quer mesmo é programar jogos de computador. Não é uma grande imagem que fica de King James fora do campo, mas parece que ninguém se importou com isso.
Depois, LeBron e o filho são sugados para o servidor da Warner Brothers pelo algoritmo que manda naquilo tipo, Al G. Rhythm (Don Cheadle), para disputarem uma partida de basquete um contra o outro no jogo que Dom criou, num argumento que tem dificuldade em se aguentar e que serve para que pai e filho terminem se entendo mutuamente. Entretanto, nos buracos deixados abertos, o realizador Malcolm D. Lee despeja literalmente tudo aquilo que seja propriedade da Warner Brothers – e a que chamam, pertinentemente, Warner ServerVerse, porque agora tudo tem que ter um universo cinemático. Há, assim, cameos, crossovers e outras referências mais ou menos directas a coisas tão distintas quanto o Casablanca e o Rick e Morty, ao Harry Potter e à Guerra dos Tronos, ao Laranja Mecânica(!) e ao Matrix. Sim, Space Jam – Uma Nova Era, em 2021, faz uma piada com o bullet time do Matrix(!).
Depois lá aparece Bugs Bunny e companhia, com o seu niilismo característico, mas até isso parece em piloto automático. Bugs Bunny não dá nenhum beijo na boca de LeBron James, a sua imagem de marca, Pepe LePew é “cancelado” para não se promover o assédio sexual e Lola Bunny, que é dessexualizada, ganha a voz de Zendaya, na opção de casting mais gratuita de sempre, depois da voz original da personagem ter sido graciosamente dispensada (Kath Soucie já tinha, inclusive, gravado todas as suas falas). Ou seja, a Warner tenta chegar a um compromisso com todas as causas sociais, mas esquece-se do mais importante: que estava aqui para fazer um filme e que, para isso, necessitava de uma argumento.
Space Jam – Uma Nova Era não tem uma única vez graça, mesmo quando tenta um gag arriscado com Michael Jordan, e LeBron James nem sequer tem momentos memoráveis no jogo de basquetebol que é o grand finale do filme. Até isso é extremamente esquematizado, limitando-se a cumprir calendário e todos os bullet points da lista do caderno de encargos que o filme tinha que atingir. Ou seja, com este Happy Meal, King James continuará sempre aos pés de His Airness, Michael Jordan. Se bem que adivinhamos que LeBron conseguirá aqui um prémio que Jordan nunca terá: o de Razzie de pior actor.
PS – ignorei propositadamente a tentativa da Warner em transformar os Looney Tunes em animação digital, porque queremos todos acreditar que foi apenas um engano que todos vão tentar fingir que não aconteceu
Título: Space Jam – A New Legacy
Realizador: Malcolm D. Lee
Ano: 2021