Ultimamente, a carreira de M. Night Shyamalan tem sido isto. Faz um filme menos mau e toda a gente fica automaticamente entusiasmada, a gritar em uníssono ele voltou, ele voltou. E depois vai-se a ver e é mentira, não voltou nada, logo a seguir ver outro filme miserável. O que será feito do realizador que entusiasmou meio mundo, catalogado imediatamente como o sucessor de Alfred Hitchcock, e autor de uma trilogia de filmes incríveis de seguida? (n.d.r. – sim, quando falei numa trilogia incrível estava mesmo a referir-me a O Sexto Sentido, Sinais e A Vila. change my mind!)
O que é certo é que Shyamalan continua ainda a beneficiar do crédito acumulado com esses filmes, o que significa que, mais uma vez, fui para Presos no Tempo com uma réstia de esperança, bem cá no fundo, que desta é que fosse. Plot twist: não foi! No entanto, Presos no Tempo não é o desastre que muito boa gente o pintou. Esses continuam a ser O Acontecimento. Sim, porque O Último Airbender é outro campeonato. Que raio!, nem sequer é o mesmo desporto, quanto mais o mesmo campeonato.
A fórmula de Presos no Tempo é a mesma de praticamente todos os filmes de M. Night Shyamalan. Um grupo de pessoas é confrontada com um acontecimento implausível, o que significa que passamos a lidar automaticamente com o paranormal, o fantástico e, consequentemente, o suspense e o terror. No entanto, é sempre um terror alicerçado na realidade. Neste caso, estamos a falar de uma praia muito especial. Uma praia paradisíaca, num resort de luxo, onde um grupo de turistas bem eclético (onde se destaca o casal de Gael García Bernal e Vicky Krieps, mais os dois filhos) vai experimentar uma praia secreta, por trás dumas escarpas altas, e descobre que não só não conseguem sair da praia (por nenhum motivo em especial, apenas não o conseguem fazer) e, pior ainda, estão a envelhecer a um ritmo brutal.
É uma daquelas (boas) ideias que alimentou a Quinta Dimensão durante décadas e que deixou lastro para muita da boa ficção-científica que veio a seguir, servindo ainda de alegoria a algo mais sério. Neste caso, é uma reflexão sobre a morte e a passagem do tempo, obviamente. Quanto à segunda boa ideia é a de quando este herói colectivo, composto pelos turistas em férias, são conduzidos a essa tal praia secreta. É que o motorista é o próprio M. Night Shyamalan, no seu cameo da praxe, mas que aqui é uma meta-referência de uma ironia finíssima: é que é o realizador itself que leva os seus personagens, em carne e osso, para o centro da intriga.
Dispostos os peões no tabuleiro, M. Night Shyamalan coloca então o lume brando e espera que a trama cozinhe. Os diálogos são sempre um horror, extremamente artificiais, o que não se percebe se é voluntário (como se Shyamalan quisesse reduzir o esquema da intriga aos arquétipos mais básicos do filme de suspense) ou involuntário (é que Shyamalan nunca foi propriamente bom a escrever diálogos, não é?). O que é certo é que isso cria um certo distanciamento de nós, espectadores, para com aquela gente. E depois nem sempre é fácil alimentar hora e meia de meia dúzia de pessoas bloqueadas num areal, a envelhecerem sem explicação lógica.
A coisa avança aos solavancos, às vezes melhor, outras vezes pior, mas onde M. Night Shyamalan se espalha ao comprido é no acto final. Na sua ânsia obsessiva de terminar sempre com um plot twist, o realizador vê-se tentado a oferecer-nos uma explicação para toda aquela trama, não fossemos nós não conseguir dormir à noite a pensar naquilo. Vai daí monta um teatrinho de faz de conta para que tudo faça sentido, explicando o desnecessário e chovendo no molhado. Presos no Tempo podia ser uma filme menor na filmografia de Shyamalan, mas que iria figurar bem na lista pelos temas que aborda e pelas opções formais do realizador; mas depois daquele final desonesto, não há nada que sobreviva ao Happy Meal.
Título: Old
Realizador: M. Night Shyamalan
Ano: 2021