Sejamos sinceros: Órfã não era um filme nada mau (e até é um pouco subvalorizado, diga-se), mas, em 2022, quem é que ainda se lembrava dele? Pelos vistos, alguém na Paramount é um grande fã do filme de Jaume Collet-Serra, porque a produtora foi resgatar os direitos de Órfã ao fundo do baú da Warner Brothers e decidiu apostar tudo numa prequela. Eis então Órfã – A Origem, filme que pode dar origem a um franchise altamente desnecessário. Por favor, não vamos contribuir para isso.
Recordemos então Órfã. Vera Farmiga e Peter Sarsgaard eram então um casal que adoptava uma menina russa, Esther (Isabelle Fuhrman), que afinal vinha-se a descobrir que era uma adulta com um tipo qualquer de nanismo e tendências homicidas. Órfã – A Origem explica então o que esteve por trás dos traumas de Esther e ainda colmata o grande plot hole do Órfã original (e com sucesso, by the way): como é que ela passou de um hospício na Estónia para um orfanato nos Estados Unidos sem ninguém se aperceber.
Um dos grandes trunfos de Órfã é que era um thriller em crescendo, com aquela criança macabra que nos provocava arrepios na espinha sem sabermos bem porquê. Aqui, como já sabemos que ela, afinal, é uma adulta homicida, não há razões para subterfúgios. O filme arranca logo com Esther em modo ultra-maníaca, como um qualquer slasher sangrento. E sim, sublinhe-se a parte do sangrento, Órfã – A Origem é bem mais gore do que necessitava realmente.
Esther consegue então fugir do Instituto Saarne, na Estónia, e viaja para os Estados Unidos fazendo-se passar por uma menina americana desaparecida. A família (Julia Stiles, Rossif Sutherland e o irmão mais velo, Matthew Finlan) recebem-na de volta e Esther fica pronta para recomeçar o seu plano em conquistar o amor daquele homem a quem chama de pai, já que é a única forma de ultrapassar o facto de ser uma adulta no corpo de uma criança e de alcançar a plenitude da mulher completa: uma esposa, uma mãe e uma amante.
Tudo isso vai acontecendo sempre a mil a hora, sem tempo para respirar, o que nos faz pensar que aquelas pessoas que dizem que William Brent Bell é o realizador mais teimosamente desinteressante do mundo têm razão. É que todas as opções, tanto de enquadramento, realização ou mesmo argumento, são sempre as mais óbvias, fáceis e aborrecidas. No entanto, a meio percebemos que há ainda outra razão. É que Órfã – A Origem inverte os papeis, Julia Stiles transforma-se inesperadamente na vilã da história e, consequentemente, Esther na heroína e, se o filme não fosse tão mau, quase que apetecia recomendar o twist.
Se Órfã já se baseava levemente em O Impostor, Órfã – A Origem vai ainda mais fundo na história real desse documentário que é mais mindfucked do que qualquer filme mindfucked que possam imaginar. A coisa não melhora na último acto do filme e até tem o seu momento à Homem-Aranha-emo, com Esther a meter uns óculos-escuros de aviador, baton vermelho nos lábios e o Maniac do Flashdance a rodar na rádio enquanto se emancipa em mulher rebelde e selvagem, e tudo caminha para o desastroso Happy Meal final. A sério, por favor, não vamos fazer com que isto tenha mais sequelas.
Título: Orphan – First Kill
Realizador: William Brent Bell
Ano: 2022