Theo Van Gogh tinha apenas 47 anos quando foi assassinado por um terrorista extremista, que não havia gostado da forma como este abordara o Islão no seu filme anterior. Como tributo ao realizador, o seu agente propôs-se a refazer três dos seus filmes em Hollywood, em língua inglesa, cumprindo assim também um sonho do próprio realizador neerlandês.
Entrevista foi o primeiro dessa empreitada. Foi encomendado a Steve Buscemi, que interpretou e realizou este remake do filme homónimo, de 2003. Entrevista é um filme de actores, num só cenário, que é por isso quase teatral. É um jeu de massacre entre um homem e uma mulher. Ele (Steve Buscemi) é um jornalista enfadado pelo trabalho que lhe incutiram de ir entrevistar uma actriz mais célebre pelo tamanho da copa do soutien ou por com quem se deita do que pelo seu talento. E ela (Sienna Miller) é a tal celebridade, cansada por ter de estar ali com mais um jornalista que não a respeita e que, ainda por cima, não consegue disfarçar a rudeza e a inconveniência.
Há um primeiro trunfo em Entrevista que começa ainda antes do início do filme e que é a sua ideia de casting. Ou melhor, o casting específico de Sienna Miller. É que existe na personagem de Katya muito de si própria. Miller, uma modelo que saltou das passarelas e das capas das Vogues deste mundo para o grande ecrã com estrondo e que acabou altamente escrutinada pelos tablóides pela sua relação com Jude Law, o que minou a sua figura pública e, consequentemente, a sua carreira, era o reflexo ideal daquela mulher fictícia idealizada por Van Gogh alguns anos antes. Por isso, chegados ao remake, Miller não era só a escolha óbito, como era também inevitável.
Entrevista é assim uma viagem de altos e baixos, construída pelos diálogos dos dois intervenientes, que desenvolvem uma relação de amor-ódio. A noite avança e, com ela, vamos mergulhando cada vez mais fundo naquelas suas pessoas, percebendo que ninguém é simplesmente aquilo que aparente. Apesar de, inicialmente, nenhum dos dois parecer ficar muito bem na fotografia – e o filme parece sempre querer ficar do lado de Buscemi, o que chega a ser irritante -, no final acabamos por perceber que aqui, tal como na vida, não há heróis e nada é simplesmente preto ou branco. E isso deve-se ao óptimo trabalho de construção das personagens e do texto.
É certo que, por vezes, estes parecem dar esticões muito fortes, para saltar de um tema para o outro, e é verdade que, no final, há uma espécie de twist meio desnecessário, como se tivesse a obrigação de alguém sair por cima daquela discussão, mas a verdade é que Entrevista é um simples e eficiente McChicken. E prova pela enésima vez que, para um filme ser bem sucedido, basta apenas uma boa história.
Título: Interview
Realizador: Steve Buscemi
Ano: 2007