Em A Lojinha dos Horrores havia uma planta carnívora alienígena que se alimentava de carne humana. Não sabemos se há alguma relação entre esse filme e Pollen, mas detectamos uma certa afinidade. Mas não é que este seja um musical de terror com plantas mutantes com a voz de Levi Stubbs. Antes pelo contrário. Pollen não podia ser mais sério.
Pollen é assim um filme que flirta com o terror através de alguns códigos do género. É mais ambiental e atmosférico, utilizando esses signos como sugestão para falar dos traumas do abuso físico e psicológico, da violação e do assédio. É um filme sobretudo de ideias e metáforas, o qual se agarra a elas com tanta força que, mesmo quando falha, não conseguimos deixar de lhe admirar a determinação.
Hera (Ava Rose Kinard) é a protagonista de Pollen, uma jovem estagiária numa empresa qualquer de contabilidade e finanças, daquelas que faz coisas com números, capitais de risco e investimentos que nunca percebemos o que significa na realidade. Hera está apostada em vingar nessa carreira profissional, mesmo que toda a gente lhe diga que não tem perfil para isso, ou porque é mulher, ou porque é demasiado boa pessoa. No entanto, qual lei de Murphy, tudo pode sempre piorar.
Quando Hera aceita sair com um dos maiorais da empresa (Tyler Buckingham) e este a força a terminar a noite na cama (numa cena verdadeiramente desconfortável – isto sim, é cinema de terror), Hera começa a ver a sua vida pessoal fracturar-se e, com isso, a sua vida profissional começar a ressentir-se. Talvez seja apenas por ser mulher e frágil, como continuam a dizer-lhe nas entrelinhas, irmã incluída. Ou, o mais provável, é estar rodeada de relações tóxicas.
É que, além do marialva que, depois de a levar para a cama, não só não lhe vai ligar de volta como ainda a humilha constantemente em público, Hera ainda tem que levar com as colegas invejosas e sonsas. Por isso, não só começa a desenvolve ruma relação obsessiva com a planta que Tyler Buckingham lhe ofereceu no tal encontro, como vai tendo umas visões de um misterioso homem-árvore(!), que nunca percebemos se é uma ameaça ou apenas uma manifestação dos seus sentimentos reprimidos.
É precisamente esta relação entre Hera e as plantas que é, simultaneamente, o melhor e o pior de Pollen. Por um lado, o relacionamento com o mundo vegetal é uma ideia forte e explorada exaustivamente, incluindo o seu próprio nome – Hera, como a erva trepadeira (e a deusa Grega da maternidade). Mas por outra lado, Pollen nunca consegue revelar muito bem o que pretende. É certo que Hera é uma crazy cat lady, com plantas em vez de gatos, mas é isso causa ou efeito? E o episódio traumático com o marialva lá do serviço espoletou a situação ou foi a gota de água que fez o copo transbordar? Na verdade, parece que o realizador D. W. Medoff também não sabe. Mas fa-lo com tamanha convicção, que Pollen é um Doube Cheeseburger positivamente falhado.
Título: Pollen
Realizador: D. W. Medoff
Ano: 2023