| CRÍTICAS | A Contagem Final

Sempre que ouvimos as palavras the final countdown, soa imediatamente lá no fundo do nosso inconsciente uma sequência de acordes num sintetizador manhoso, qual cão de Pavlov, que não temos sequer de dizer qual é para saberem do que estou a falar. É um reflexo condicionado, resultado de anos de sobre-exposição a essa canção homónima dos Europe, lançada em 1986. O que pouca gente sabe (ou se lembra), passados estes anos todos, é que os suecos foram buscar o título da música ao filme com o mesmo título, de 1980.

A Contagem Final é a história do porta-aviões da marinha norte-americana, USS Nimitz, capitaneado por Kirk Douglas, no preciso dia em que recebem a bordo Michael Sheen, analista de sistemas enviado por um ricaço misterioso para observar como as coisas funcionam por ali. Esse ricaço é um gato escondido com o rabo de fora, um mcguffin mal descaracterizado que nos vai deixar sempre com a pulga atrás da orelha.

Depois, o navio há de atravessar um redemoinho esquisito na atmosfera e, quando a tripulação recupera os sentidos, apercebem-se que estão em 1941, precisamente a poucas horas do ataque japonês a Pearl Harbour. Essa percepção não é imediata e o processo vai permitir que várias dúvidas e questões filosóficas e existenciais começar a crescer na cabeça daquele homens. O que fazer? Aproveitar o couraçado de guerra e intervir, evitando a morte de centenas de homens? Ou recusar mexer na história para não arruinar a continuidade temporal? E, moralmente, onde é que essa decisão se situa?

A Contagem Final é um filme de uma ideia e, temos de ser sinceros, é uma boa ideia. Stephen King, certamente, gostava dela, já que há aqui vários elementos da sua obra. A Contagem Final é um dos primeiros grandes filmes sobre viagens no tempo e, mais especificamente, sobre o paradoxo da predestinação. Aliás, é aqui que entra a figura do tal ricaço misterioso, numa espécie de twist final que procura rematar o filme, já que o realizador Don Taylor opta por terminar o filme antes das grandes decisões terem de ser tomadas. É que assim que a armada japonesa está a chegar a Pearl Harbour, surge novamente o tal fenómeno atmosféricos e lá vai o USS Nimitz de volta à actualidade.

Don Taylor dá ainda um toque de classe ao argumento ao criar a figura fictícia de um senador (Charles Durning), que ajuda o filme a ganhar consistência e credibilidade com a realidade. Contudo, se há coisa que A Contagem Final nunca consegue disfarçar é o alto patrocínio do exército norte-americano, tendo longo momentos de propaganda bélica, que quase nos faz saltar do sofá, bater continência e gritar “USA, USA”. Não admira que a Hungria tenha chegado mesmo a banir o filme, cansada de tanto imperialismo capitalista. A Contagem Final é exaustivo a mostrar detalhadamente como opera um porta-aviões, como os jactos abastecem em pleno voo ou como aterrar naquele espaço exíguo quando o trem de aterragem do jacto não está 100 por cento operacional. E isso pode ser um pouco enjoativo na digestão do McChicken.

Título: The Final Countdown
Realizador: Don Taylor
Ano: 1980

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