Soko começou a dar que falar com umas canções no antigo myspace, na altura em que o homem ainda nem sequer caminha na posição vertical, mas foi com I’ll Kill Her que se tornou mesmo em fenómeno, especialmente porque Stella McCartney começou a usar a música nos seus desfiles. Era uma espécie de Alanis Morissette adolescente, mas em lo-fi e com mais girl power. Entretanto continuou a fazer pequenos papéis no cinema, anunciou que desistia da música, voltou a avisar que regressava e manteve-se activa na representação. Até que chega A Dançarina, a sua primeira grande prova, num biopic de Loie Fuller.
E quem foi Loie Fuller? Foi uma das pioneiras da dança moderna, que inventou inclusive a serpentine dance, tendo sido um dos grandes ícones da belle epoque. Além disso, foi também um exemplo de emancipação feminina, ao fazer o percurso inverso que os habituais underdogs fazem. É que Loie trocou os Estados Unidos, a terra dos sonhos onde tudo é possível e qualquer pode vingar, pela Europa, e foi aí que realmente triunfou e deixou de ser apenas um adereço que entretinha nos intervalos das peças de teatro.
Esse é, precisamente, um dos principais trunfos de A Dançarina, o de encarar a arte como resultado de muito génio, claro, mas sobretudo de muito trabalho (Whiplash – Nos Limites é uma das poucas excepções). Normalmente, os filmes biográficos têm a tendência de endeusar os artistas, que nasceram para criar e que o fazem sem esforço. Loie Fuller pagou com o próprio corpo a sua própria arte e a degradação física de Soko ao longo do filme (os olhos queimados das luzes, os músculos doridos do peso do vestido, o corpo deformado do esforço) é uma das melhores coisas deste filme de Stéphanie Di Gusto. E quando entra em cena Isadora Duncan (Lily-Rose Depp a mostrar que é tão bom ter bons genes na família…), jovem prodígio da dança moderna, é que se estabelece o verdadeiro confronto do filme, entre arte e trabalho, esforço e dedicação e outras dicotomias tais.
Infelizmente, A Dançarina nem sempre rola sobre rodas. Aliás, o problema é até o inverso, porque muitas vezes as coisas parecem demasiado fáceis na vida de Loie Fuller. A forma como consegue uma oportunidade de se mostrar, a vida enquanto mulher-artista numa sociedade claramente de ascendente masculino ou a relação com a mãe conservadora. No entanto, a disponibilidade (especialmente física) de Soko, a recriação dos seus espectáculos (em sequências de uma plasticidade vibrante, que quase salta do ecrã de cinema) e o elogio que faz a Loie Fuller fazem de A Dançarina um filme vencedor. Vencedor de um McBacon.Título: La Danseuse
Realizador: Stéphanie Di Giusto
Ano: 2016