| CRÍTICAS | Salve, César!

Desde o primeiro filme, Sangue por Sangue, que os irmãos Coen têm revelado o sem apreço pelos géneros clássicos de Hollywood. Nesse caso, era um neo-noir, mas quase 20 anos depois, com O Barbeiro, fariam o seu próprio film noir, a preto e branco e tudo, e mais recentemente experimentariam também o western, com Indomável.

No entanto, nenhum desses filmes é um tributo tão grande a Hollywood – à indústria enquanto máquina de sonhos, entenda-se – quanto Salve, César! Este é um filme de época sobre os bastidores de Hollywood, mais propriamente os do estúdio Capitol, que apesar de ser fictício, tem uma série de referências e piscadelas de olho mais indirectas a uma série de gente real.

Salve, César! é um filme-coral que tem como peça central e unificadora Eddie Mannix (Josh Brolin), uma espécie de pau para toda a obra do estúdio. Ao longo de 24 horas – apenas mais um dia normal no escritório -, Brolin terá que lidar com o rapto do protagonista do filme de época sobre Cristo, George Clooney, pelos comunistas; que resolver a maternidade indesejada da diva Scarlett Johansson;que aturar as exigências do patrão e convencer o realizador do seu dramalhão de faca e alguidar de que a jovem estrela dos westerns, Alden Ehrenreich, é a escolha ideal para o papel de galã; e, claro, tomar a decisão sobre o seu próprio futuro, perante uma proposta irrecusável de outra empresa.

Apesar de George Clooney, que continua aqui a sua série de idiotas ao leme dos Coen, e o seu filme crístico darem o título a Salve, César!, Josh Brolin é a única personagem digna desse nome. Todos os outros são, uns mais que outros, arquétipos que servem para passar uma mensagem ou uma ideia, fazendo com que o filme seja um pouco uma sucessão de episódios.

No entanto, é precisamente nesses filmes dentro do filme que reside o principal encanto de Salve, César! Começando logo pelo tal épico bíblico à Cecil B. DeMille, passando pelo western de Alden Ehrenreich que tem Dean Martin escrito em todo o lado e terminando no musical com marinheiros de Channing Tatum, que é numa única cena o melhor filme de Fred Astaire que este não fez. Além disso, a sátira a Hollywood e o humor subversivo é por vezes tão corrosivo quanto acutilante, com destaque para as cenas em que os raptores comunistas se perdem em longos diálogos com o raptado sobre O Capital, com k(!), que é digno do melhor Woody Allen.

Portanto, Salve, César! é uma carta de amor que os manos Coen escreveram à Hollywood que lhes serviu de professor, modelo e influência do seu Cinema (assim mesmo, com maiúscula). Pode não ser o seu melhor filme – e não o é, de certeza -, mas é um dos mais deliciosos McRoyal Deluxes da sua filmografia.

Título: Hail, Caesar!
Realizador: Ethan & Joel Coen
Ano: 2016

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