É claro que, tendo em conta o actual cenário de emergência higiénico-sanitária que vivemos, o subgénero do filme de pandemia parece ser muito mais pertinente, mas este sempre foi um tema com tradição, inclusive na literatura. Há os óbvios exemplos do nosso Saramago (com o Ensaio sobre a Cegueira, que também já foi adaptado ao grande ecrã) ou de A Peste, de Camus, que agora tem sido lido aos milhões, mas já em 1912 Jack London escrevia A Praga Escarlate, por exemplo, ou Mary Shelley lançava o seu The Last Man em 1826(!).
Por isso, de certa forma, Love and Monsters dá sempre lembranças de um monstro de Frankenstein, já que nos dá a sensação regular de que estamos ver algo que já vimos antes. Incluindo o próprio tom e estilo do filme, que remete imediatamente para Bem-Vindo à Zombieland, se bem que com criaturas gigantes em vez de zombies.
Estamos então num futuro hipotético não muito distante, em que a radiação gerada por uns mísseis usados para destruir um meteorito que se aproximava ameaçadoramente da Terra, fez mutar os insectos até proporções XXL, que acabaram por dizimar a Humanidade. Restam pequenas comunidades subterrâneas, que vão sobrevivendo como podem. É numa delas que vive Joel (Dylan O’Brien), uma jovem neurótico e com tendência para a auto-depreciação, que se sente cada vez mais sozinho enquanto vê todos à sua volta a pinar menos ele.
Joel vai então encher-se de coragem e decidir atravessar 150 quilómetros à superfície, até à colónia onde vive a sua namorada (Jessica Henwick), que não vê desde o apocalipse. Essa viagem, que vai incluir adoptar um cão (que remete logo para Um Rapaz e o Seu Cão, esse modelo do filme pós-apocalíptico, se bem que sem a parte misógina), fazer amizade com dois sobreviventes (Michael Rooker e Ariana Greenblatt) ou enfrentar piratas, vai ser também uma viagem interior, que o vai fazer crescer e mudar. E o amor vai ter um papel determinante.
Tal como a série da Netflix, Love, Death and Robots, Love and Monsters é um divertido e bem-dispostos filme de aventuras sobre o amor, a vida e a morte, mas com insectos gigantes em vez de robôs. Esgota-se rapidamente por estar sempre a querer passar por em vez de se limitar simplesmente a ser e, quando termina o último acto, lança a sua mensagem moralista apelando à coragem para enfrentar o mundo exterior, na rua, sem medo. O que, tendo em conta a actual emergência higiénico-sanitária soa um pouco a filme negacionista e anti-máscara, o que quero acreditar ser apenas a minha paranóia a ver coisas onde elas não existem. Por isso, sem interpretação negacionista, Cheesebruger; com interpretação negacionista, Pão com Manteiga e uma cuspidela lá dentro.
Título: Love and Monsters
Realizador: Michael Matthews
Ano: 2020