| CRÍTICAS | O Esquema Fenício

O cinema de Wes Anderson já é reconhecível a léguas de distância, de tal forma que o seu nome já se tornou, ele próprio, num adjectivo. Dizemos que um filme é wesandersoniano quando tem aquela estética nostálgica, simétrica e as cores saturadas, de tal forma que até já há um site (e um livro) que compila localizações que parecem directamente saídas de um dos seus filmes (olá Accidentally Wes Anderson). No entanto, agora também já podemos começar a dizer que o seu corpo de obra também obedece a um conjunto de temas recorrentes.

O Esquema Fenício, o seu mais recente trabalho, é assim, formalmente falando, mais uma construção metódica e obsessiva de cenários montados ao pormenor, sempre muito simétricos e com predominância por objectos e localizações… particulares. Já tematicamente, O Esquema Fenício é mais um filme sobre famílias disfuncionais e sobre um pai (Benicio Del Toro) em busca de redenção junto da filha (Mia Threapleton). Onde é que já vimos isso? Claro, em Os Tenenbaums – Uma Família Genial. E, praticamente, em todos os seus outros filmes.

Benicio Del Toro é então Zsa-Zsa Korda, um empresário implacável e metido em praticamente tudo (do mais ao menos censurável), que é regularmente vítima de assassinato. Aliás, O Esquema Fenício abre com uma dessas tentativas, numa das melhores cenas do filme. A bordo de um avião, um tipo é explodido da cintura para cima (é a cena mais sangrenta e violenta de todo o corpo de obra de Wes Anderson até há data) e Del Toro despede (e ejecta) o piloto em plena aterragem (queda?) de emergência. Esse episódio de quase morte (mais um) faz Del Toro repensar a vida e decide deixar o seu império à filha, uma noviça a poucos dias de completar os seus votos (Mia Threapleton), ao mesmo tempo que procura fechar o seu negócio mais ambicioso de todos: investir na industrialização da fictícia Fenícia através de um intrincado e complicado esquema, que envolve escravatura (ou não), o controle das infra-estruturas locais e o domínio dos sistemas de produção.

Tal como em Grand Budapest Hotel, Wes Anderson cria aqui um pequeno mundo muito próprio, cheio de referências cinematográficas (começando logo pelo próprio nome do protagonista, Zsa-Zsa…) e piscadelas de olho a uma certa ideia de Mitteleuropa. Depois, volta a convocar um elenco-coral de estrelas (Benicio Del Toro, Tom Hanks, Bryan Cranston, Scarlett Johansen…), ao qual se junta os seus habituais comparsas (Willem Dafoe e Bill Murray, com este a fazer de Deus, finalmente). Ou seja, O Esquema Fenício é mais um filme de Anderson igual a todos os outros anteriores, excepto tudo o resto. Ou seja, a diferença entre um novo filme de Wes Anderson e um antigo é absolutamente nenhuma. É parecido com Woody Allen. A diferença entre um bom e um mau filme do realizador norte-americano é… nenhuma.

O Esquema Fenício funciona mais ou menos por vinhetas, com Benicio Del Toro e Mia Threapleton a viajarem pelo mundo para encontrarem vários actores secundários que o primeiro precisa de convencer a investir no seu esquema fenício. No entanto, não estou totalmente convencido de que isso é necessariamente propositado. É que o argumento parece que foi sendo escrito à medida que iam filmando, com partes que são um pouco coladas à força. É certo que o próprio esquema fenício nunca é devidamente explicado, mas isso não é importante, já que é apenas o mcguffin que faz girar o mecanismo do filme (e todos sabemos como os mecanismos fílmicos de Anderson são precisos e minuciosos). Mas o próprio círculo narrativo do filme deixa sempre a ideia no ar de que precisava de ser mais limado antes do início das filmagens.

Mesmo assim, O Esquema Fenício é talvez a comédia mais assumida de Anderson desde (outra vez) Os Tenenbaums – Uma Comédia Genial, com uma pitada negra e duas de absurdo. Isso resulta em um par de cenas que ficarão a ressoar no cânone wesandersoniano, assim como na personagem deliciosa de Benedict Cumberbatch (com uma cena de acção inesquecível). Já Michael Cera continua a não conseguir convencer-me de que a sua carreira começou como uma anedota que foi demasiado longe e que agora ele já não sabe como parar. Tudo isto resulta num confuso Cheeseburger, que nas mãos de Wes Anderson costumava ser mais saboroso.

Título: The Phoenician Scheme
Realizador: Wes Anderson
Ano: 2025

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